Turma da Mônica Jovem: Reflexos do Medo…e do público

É fim de tarde do domingo imediatamente após a estreia de Turma da Mônica Jovem: Reflexos do Medo, em 18 de janeiro, e a sala de cinema não está tão cheia. O público é formado majoritariamente por crianças, com idades variando entre seis (a classificação indicativa é dez anos, mas os pais podem entrar com filhos menores sem nenhum problema) e onze, doze anos. Algumas estão em grupinhos capitaneados por um irmão mais velho ou uma tia, a maioria está com os pais.

Durante o filme, a atenção é total. Riem com as piadinhas (em especial quando Cebolinha, quer dizer, Cebola leva um susto ou beija o ar sonhando com Mônica), alertam os personagens de perigos iminentes e interagem o tempo todo com a tela. “Papai, estou ficando com um pouco de medo, se eu não dormir de noite hoje é por causa disso”, avisa um menorzinho ao jovem adulto que o coloca no colo e segura a mão dele, numa atitude protetiva e bem recebida.

E quando Mônica tenta tirar Carminha Frufru do transe aos chacoalhões, um grupinho de meninas faz coro de “tapa, tapa, tapa”, arrancando mais risos dos adultos presentes do que todos os (vários) punchlines que aparecem em 85 minutos do filme. Para a infelicidade das garotas que queriam a treta e o conforto dos pais dos menorzinhos, Mônica desperta a rival com abraço e frases feitas de que o amor é mais forte.

Ao final do filme, fica claro que uma continuação está nos planos, seja pela cena de encerramento com moscas no céu – o que, já sabe quem lê os quadrinhos, indica que Capitão Fei…ooops, Poeira Negra vem aí – ou pela cena pós crédito redundante em que Cascão vai em busca do tio. E aquela turminha toda sai do cinema comemorando que “vai ter o dois.”

Mas espere aí. Estamos falando do mesmo filme que ficou aquém das expectativas de bilheteria na estreia, com público registrado de 73 mil pessoas entre quinta-feira (18) e domingo (21), faturando R$ 1,48 milhão e se posicionando apenas em 7º lugar nas bilheterias do país. E que vem colecionando críticas que incluem reclamações de um roteiro cheio de “autoajuda” (confere), “mistura malfeita de elementos de fantasia, tensão e suspense” (será?) e que em nenhum momento “cativa ou diverte” (sério?).

Este último comentário obviamente foi feito por alguém meio de mal com a vida e que assistiu ao filme em “cabine” – aquelas apresentações exclusivas para jornalistas – e não em um cinema com crianças.

Porque é aí que reside X da questão: Turma da Mônica Jovem: Reflexos do Medo não foi feito para a crítica e, para falar a verdade, nem para um público mais amplo. Diferentemente do fenômeno Turma da Mônica, que desde o surgimento da gorducha em 1963 veio cativando um público das mais diferentes idades, a linha TMJ, criada em 2008 no estilo mangá, é um produto nichado.

E eis aí o erro de boa parte dos críticos de cinema: comparar esse filme com Turma da Mônica: Laços (2019) e Turma da Mônica: Lições (2021).  Diferentemente do filme atual, esses dois foram baseados nas duas primeiras Graphic Novels de uma trilogia elaborada pelos irmãos Lu e Vitor Cafaggi (o terceiro número, que não ganhou as telas ainda, leva o título de Turma da Mônica: Lembranças).

Aqui vale um parêntese para quem nunca leu nada desta linha de produtos: as Graphic MSP, como são chamadas, são fruto de um projeto lançado em 2012 e que já atingiu um total de 40 diferentes títulos lançados até 2023. Na prática, Maurício de Sousa “empresta” personagens a autores convidados que, com traço e roteiro próprios, criam histórias fascinantes, uma melhor que a outra. Não é exagero dizer, inclusive, que a maioria esmagadora delas pode ser transformada em bons filmes. São roteiros praticamente prontos.

Turma da Mônica Jovem: Reflexos do Medo se inspira em uma linha de revistas e não em uma aventura em si. Uma linha de revistas que foi bem aceita, que teve recordes de venda (em especial na edição de casamento de Mônica e Cebola), mas que ainda assim é voltada para um nicho bem mais estreito que a turminha original.

No filme há diversos elementos muito presentes em quase duas centenas de edições (e três séries) dos quadrinhos de TMJ, como é conhecida pelos fãs. Por exemplo, a paixão visível e que patina entre Mônica e Cebola (e o fato dele agora querer ser chamado assim), as inseguranças e novos desafios do ensino médio, as angústias, a habilidade de Cascão no Parkour, o fato de algumas aventuras envolverem magia e mistério.

Também não faltam referências comuns aos gibizinhos de linha tradicional, como a inspiração para o vilão do filme, o Cabeça de Balde, que estreou na revista regular da Turma da Mônica em 2016, na história “O vilão que queria demais.” Ou seja, o roteiro é não foi baseado em uma única história e sim em uma saladona mista para introduzir a Turma da Mônica Jovem no mundo das telonas.

Com direito a mudanças que talvez incomodem alguns fãs dos quadrinhos, como Denise aparecer namorando Jeremias (pobre Xaveco, não bastasse a sina de secundário agora acabou esquecido…)

Isso posto, Reflexos do Medo com certeza não se compara a Laços e Lições, que juntos levaram quase 3 milhões de pessoas aos cinemas. Mas não custa ressaltar: nem devem ser comparados, pois se trata de produtos totalmente diferentes.

Falando de maneira exagerada, mas apenas para deixar a imagem mais clara, é como se alguém resolvesse contrastar Baby Shark com Megatubarão, apenas porque ambos têm como personagem o mesmo tipo de peixe. Ou, para ficar em versões diferentes de um mesmo personagem, analisar o terrível Ursinho Pooh: sangue e mel como se fosse sequência  de um dos desenhos do animalzinho fofo  lançados pela Disney… que, é sempre é bom frisar, não é uma ursinha canadense.

De volta a Turma da Mônica Jovem: Reflexos do Medo, deixando-se de lado a amargura exagerada de parte da crítica, é preciso admitir que, sim, o filme poderia ser melhor. Realmente há momentos em que as frases de autoajuda/valorização são excessivas ou que os atores – até mesmo por causa de uma direção fraca, dizem alguns – não convencem muito.

A exceção talvez seja Bianca Paiva, sempre muito à vontade como Magali, contudo nem mesmo o excelente Matheus Solano se destaca como deveria, em parte porque a modulação de voz escolhida por ele para o personagem é prejudicada pelo som (se de algumas salas de cinema ou do próprio filme é difícil dizer).

E o suspense/terror leve é, de fato, leve, como convém a um filme cujo público-alvo são crianças. Quando se tem isso em mente e se vê a reação delas no cinema, fica claro que ele atingiu o alvo, ainda que aparentemente não tenha atingido a bilheteria desejada.

Turma da Mônica Jovem: Reflexos do Medo é um bom programa para assistir com os pequenos, um programa família, despretensioso. Mais do que refletir o medo, ele reflete a expectativa de um público específico. E por enquanto fica de bom tamanho.

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