Sua infância não foi destruída: Pooh NÃO é uma ursinha

O ursinho Pooh – ou Puff, para os mais velhos – é fêmea e nasceu no Canadá. Talvez você tenha ouvido falar essa bobagem que levou muita gente a achar que uma parte de sua infância nunca mais seria a mesma. Não se preocupe, isso é tudo besteira.

Mas, ao contrário de diversas lendas que circulam pela Internet e além, esta tem uma origem bem definida. Tudo começou em novembro de 2015, graças a certas manchetes apelativas que saíram no mundo inteiro, inclusive aqui no Brasil. Confira algumas delas:

 Veja: Transgênero? Ursinho Pooh é, na verdade, fêmea

G1: Ursinho Pooh é fêmea, revela escritora em novo livro infantil

O Globo: Livro infantil revela que ursinho Pooh é fêmea

Capricho: Novo livro revela que Ursinho Pooh é na verdade uma garota

Acontece que estes títulos foram, pra não dizer ridiculamente sensacionalistas, carregados demais na tinta. E muita gente não leu as matérias, simplesmente ficou com a informação contida neles e, como quem conta um conto aumenta um ponto, a coisa foi se distorcendo até Pooh mudar de sexo.
Na verdade, o que foi – ou deveria ter sido – noticiado, é: “Pooh teve parte do nome baseado em uma ursa de verdade e história da ursa é contada em livro infantil”
Isso mesmo. Parte do nome. Pra ser mais exato, a primeira parte dele em inglês, língua original do conto do escritor inglês Alan Alexander Milne. E, se é pra falar a verdade, parte do segundo nome que o personagem recebeu. Confuso?

Então vamos lá: em 1924, Milne publicou um poema chamado Teddy Bear (urso de pelúcia) no qual havia um ursinho chamado Edward Bear. O dono do ursinho no poema era inspirado no filho de Milne, Christopher Robin, e o próprio ursinho no brinquedo real do menino, que o chamava de Edward.

Acontece que em 1925, Milne retomou o personagem em uma história que publicou no jornal The Evening News e, como o filho havia renomeado o brinquedo na vida real, fez a mesma coisa com o ursinho literário (e que veio a se tornar desenho animado, história em quadrinhos, brinquedo, videogame e por aí afora). A partir daquele momento, Edward virou Winnie-the- Pooh.
A mudança ocorreu porque o verdadeiro Christopher Robin se apaixonara por uma ursa do zoológico de Londres, que frequentava com papai Milne, chamada Winnie. E é a história desta ursa Winnie que a autora canadense Lindsay Mattick conta no livro Finding Winnie: The True Story of the World´s Most Famous Bear, obra que gerou as manchetes distorcidas mundo afora.

A ursa pertencia ao tenente canadense Harry Colebourn, bisavô da autora, que a adquiriu em 1914 e batizou-a como Winnie em homenagem à cidade canadense de Winnipeg – tempos depois, o animal foi doado por Colebourn ao zoo de Londres.

Cabe aqui um parêntese: apesar de o militar ter escolhido como uma homenagem à cidade, o nome próprio “Winnie” existe e é unissex. Ou seja, ele é utilizado tanto para mulheres – como apelido/variante de Edwina, Winifred, Gwendolyn, Guninevere ou Wynne (talvez alguém se lembre de Gwendolyn “Winnie” Cooper, da série Wonder Years) – quanto para homens. Neste último caso, é o apelido de Winston, Edwin, Darvin e Wyn, entre outros (o presidente inglês Winston Churchill, por exemplo, era chamado de Winnie pelos mais próximos).

Fechado o parêntese, fica claro que Pooh não é fêmea – nem ao menos canadense – e sim teve parte do nome inspirado por uma ursa de verdade. Ênfase em “parte” porque, afinal, ele não é conhecido como “ursinho Winnie”.

Mesmo em inglês, ora ele é chamado de Winnie the Pooh, ora de ursinho Pooh (Pooh Bear). E, surpresa das surpresas, o nome Pooh foi dado em homenagem a outro animal que pai e filho conheceram. Para ser exato, um cisne chamado Pooh. Importante notar que a palavra “pooh”, na língua inglesa, é uma interjeição que significa “desdém” ou “descrença”.

Mas, no final das contas, talvez seja melhor não contar pra certas mídias tudo isso. Porque, se elas ficarem sabendo, corre-se o risco de a próxima manchete ser “Transgênero e trans espécie: além de fêmea, ursinho Pooh é um cisne desdenhoso e descrente”…

Chita, Lassie, Flipper e Rintintin: quando machos são fêmeas e vice-versa
Se algumas mídias fizeram sensacionalismo porque uma ursa inspirou parcialmente o nome de um personagem, imagine se ficarem sabendo que personagens famosos de histórias na TV e no cinema foram “interpretados” por animais de outro sexo.
Chita (Cheetah), a chimpanzé companheira de Tarzan, por exemplo, foi interpretada na maioria dos filmes – e episódios na televisão – por Mike (que também ficou conhecido pelo nome de Chita), um símio que morreu em 2011, aos 80 anos de idade.
Já com Lassie, a história foi diferente. A cadela mais famosa da telinha e da telona  foi interpretada durante anos por Pal, um macho da raça Collie. Depois que ele faleceu, descendentes de Pal – como Boy, Howard e Mason, todos machos – deram vida a Lassie.
A preferência por meninos se dava por causa da pelagem: tanto o macho quanto a fêmea da raça perdem pelo no verão, quando a maioria dos filmes era feita, mas o macho tem mais pelo e por isso não se nota tanto.
Além disso, os machos são maiores que as fêmeas e na história original, Lassie era descrita como uma cachorra grande e vistosa, logo… Um detalhe curioso é que muita gente chegou a espalhar que a utilização dos machos se dava porque eles eram mais inteligentes que as fêmeas. Bobagem. Aliás, na maioria das vezes ocorria o contrário e por isso fêmeas eram utilizadas como dublês em algumas cenas onde Lassie precisava fazer truques.
Mudando de animal, o famoso golfinho Flipper, que na história é macho, foi interpretado sempre por fêmeas (Susie, Kathy, Patty, Squirt e Scotty). As golfinhos são menos agressivas que os machos e, diferentemente deles, não exibem marcas e cicatrizes adquiridas em lutas com outros golfinhos.
Porém… mais uma vez houve um dublê. Apesar de fazer todos os truques, as fêmeas não conseguiam fazer a famosa cena na qual o animal fica “em pé” sobre o rabo e sai se movimentando na água. Nestas cenas entrava em ação Clown, um golfinho macho.
Já no caso do cachorro Rintintin, vale lembrar que o personagem que tanto fez sucesso no rádio a partir dos anos 1930 e na sequência na TV e cinema (foram 27 filmes com o superstar canino), onde foi popular até os anos de 1970, foi baseado em um cachorro de verdade, do mesmo sexo. A história real é a do Cabo Lee Duncan, da Força Expedicionária dos EUA, que na primeira guerra mundial encontrou cinco cãezinhos pastor alemão em um canil bombardeado. O regimento adotou a ninhada e o cabo ficou com um casal, que batizou como Rintintin e Nénette.
Até 1932, o próprio Rintintin fazia as vezes de estrela do seu programa. Depois da morte do cão, naquele ano, a tarefa passou para o filho dele, Rintintin Jr., que morreu em 1941 de pneumonia e foi substituído por outro descendente, sempre macho, e assim ocorreu sucessivamente. Ora, se o cão era macho e sempre foi interpretado por machos, por que está nesta matéria?
Bem, porque os nomes Rintintin e Nénette foram dados pelo cabo em uma referência a amuletos franceses de dois bonecos que têm este nome e que a população francesa costumava entregar aos soldados americanos para dar sorte. Só que, segundo o criador da dupla de bonecos, Francisque Poulbot, Rintintin é do sexo feminino, o que provavelmente levaria a imprensa sensacionalista a “manchetar”: “Rintintin é uma menina francesa e não um pastor alemão…

 

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