Sem chororô nem clickbait: Avatar da Netflix é bom e fim de papo!

Em tempos de clickbait, em que reclamar e criticar de tudo dá audiência, dizer que um produto é ruim, medíocre e disparar a metralhadora é mais fácil – e às vezes mais rentável – do que analisar com calma e elogiar o que tem de ser elogiado.

Talvez por isso, mesmo já tendo apresentado números estrondosos desde o lançamento em 22 de fevereiro – mais de 22 milhões de visualizações nos primeiros quatro dias (em uma semana, o número de horas assistidas da série pelos assinantes ultrapassou 150 milhões) – e ter ficado entre as top10 regularmente, o que já garantiu o anúncio de renovação por mais duas temporadas, a série Avatar: O Último Mestre do Ar virou alvo favorito de uma galera que só vê defeitos nela.

De comentários mais “puristas” do tipo “a adaptação não seguiu a ordem e número de episódios dos desenhos” a outros que parecem ter sido feitos por quem nem se deu ao trabalho de assistir o live action da Netflix (“É só uns tio fazendo mortal chato”), o que falar importa é falar mal. Só tem um detalhezinho que está gerando problema  pros haters: a série é boa!

Mas nada de passar o carro na frente dos bois. Antes de falar do live action, é preciso falar da animação original. Criado pela dupla de animadores e roteiristas Michael Dante Dimartino e Bryan Konietzko, o desenho animado Avatar The Last Air Bender foi exibido orginalmente pelo canal Nickelodeon de 2005 a 2008. Ao todo, foram 61 episódios de 22 a 24 minutos cada, divididos em três temporadas.

Importante ressaltar que, apesar do traço e do senso de humor bem característicos dos mangás e animes (quadrinhos e desenhos animados japoneses), a animação não só nasceu nos Estados Unidos como nunca teve versão anterior em gibis. Ainda que, com o sucesso da série, algumas aventuras e histórias curtas foram lançadas pela Dark Horse Comics (no Brasil, pela Intrínseca).

A história se passa em um mundo fantasioso habitado por quatro nações nas quais há pessoas capazes de manipular os diferentes elementos: água, terra, fogo e ar. Com a função de ajudar a manter o equilíbrio e auxiliar as pessoas de tempos e tempos surge, em uma das nações, uma pessoa extremamente poderosa e capaz de manipular com maestria os quatro elementos, chamada de Avatar.

Esta pessoa nasce em uma das nações e, quando morre, uma outra encarnação do Avatar nascerá em outra delas. Acontece que, quando o desenho animado começa, o avatar do momento é ainda uma criança em treinamento da nação do Ar, chamada Aang, e a Nação do Fogo tem planos para dominar as demais.

Esses planos levam os fire benders a atacar e eliminar toda a Nação do Ar, menos Aang, que desaparece e só desperta um século depois, em meio a um mundo dizimado pela guerra e ainda sob o domínio do fogo.

Junto com novos amigos – inicialmente os irmãos Sokka e Katara, da Tribo da Água do Sul – Aang terá que aprender a dominar todos os elementos para derrotar o Senhor do Fogo Ozai e todas as hordas dele, de modo a equilibrar o mundo mais uma vez.

Eis aqui o primeiro ponto favorável do live action: o enredo do desenho animado foi seguido à risca, inclusive com as imagens e locais mais insólitos sendo recriados lindamente por computação gráfica. As paisagens que saíram da imaginação de Dimartino e Konietzko parecem reais e são de tirar o fôlego.

O mesmo vale para as criaturas, como o lêmure orelhudo Momo e o (não necessariamente nessa ordem) fofo, preguiçoso e poderoso bisão voador de Aang, Appa. Os personagens humanos do desenho também ficaram muito bem caracterizados e tiveram as principais aspectos de personalidade respeitados.

O ator canadense Gordon Cormier está muito bem como Aang e equilibra o humor infantil do personagem com doses de melancolia pelo que aconteceu enquanto ele esteve “fora do ar.” Há quem diga que no desenho Aang é mais divertido e disso não há dúvida (até porque a pegada de comédia da animação é maior do que a do live action, que segue na linha aventura, ação e fantasia), mas nada que comprometa.   

Ian Ousley e Kiawentiio  mandam bem demais como Sokka  e Katara e, pelo menos nesta temporada inicial, também funcionam mais individualmente do que as contrapartes na primeira fase do desenho, no qual praticamente só agem quando estão juntos com Aang.

Os grandes destaques, porém, ficaram do lado dos vilões. Dallas Liu parece ter nascido para encarnar o príncipe Zuko, herdeiro banido da Nação do Fogo que tem como principal missão capturar o avatar, em busca do perdão e boas graças do pai. E Paul Sun Hyung Lee está tão perfeito como o bonachão e inteligente general Iroh que a sensação de quem assiste é de que o personagem do desenho ganhou vida.

Movimentos e lutas

As lutas do seriado são muito bem feitas, aliando movimentos de artes marciais com os efeitos especiais gerando água, fogo, terra e ar. Porém elas vão além de uma simples coreografia: a produção do live action resolveu se inspirar em um tipo diferente de arte marcial para cada tipo de dobra.

A de Água, por exemplo, foi inspirada na fluidez do Tai Chi Chuan, que tem movimentos circulares e contínuos que acompanham e complementam os movimentos do adversário. Vale lembrar que dizem que o Tai Chi pode ajudar na cura de doenças, e os mestres da Água no desenho e no seriado também podem usá-la para a cura.

Os movimentos dos manipuladores de Terra remetem ao Kung Fu enquanto os dos mestres do Fogo tiveram inspiração em técnicas como o Cha Quan e o Ba Ji Quan. Por fim, os air benders parecem ser adeptos do Bagua, que é focado mapear e canalizar energia, o que cai muito bem para uma luta mais defensiva.

Adaptações

Uma das queixas dos chamados “puristas” é de que o seriado não respeitou o conteúdo dos episódios. No live action o capítulo sobre a cidade estado de Omashu, por exemplo, junta elementos de outros episódios dos desenhos, como Jet (no desenho o líder dos Guerreiros da Liberdade tem episódio próprio e não mora em Omashu) e The Northern Air Temple (no seriado, Teo e o pai, Mecânico, também vivem em Omashu).

Também há outras mudanças, como, por exemplo, a inclusão de partes de A Caverna dos dois Amantes (desenho da segunda temporada). Enquanto na animação neste episódio o trio de heróis é acompanhado pelos bardos na caverna e acaba se dividindo – o que deixa Aang e Katara sozinhos e gera uma engraçada cena “meio romântica”  – no live action apenas os irmãos  da Tribo da Água seguem pelo labirinto e acabam indo se encontrar com Aang que, naquela altura, já batalhava o rei Bumi.

Portanto, sim, é  verdade que o roteiro do live action costura alguns episódios do desenho. É a isso que se chama de adaptação. Daí a dizer que houve desrespeito com a obra original ou que a série da Netflix comete alguma atrocidade com o original é uma grande diferença.

Por mais que tenha promovido a fusão de alguns episódios e até ignorado um ou outro fato do desenho, o resultado ficou muito bom. E, vale lembrar, dá para comparar na própria Netflix, que também tem à disposição dos assinantes todas as temporadas do desenho animado!

Produtos diferentes

Neste sentido, vale aqui um alerta. Se você nunca assistiu antes ao desenho animado, vale começar a imersão em Avatar pelo live action, pra não ter spoilers sobre o seriado antes da hora.

Depois de assistir a série, com certeza a curiosidade pelo desenho será despertada e aí, sim, vale ver a animação da Nickelodeon. Mas só a primeira temporada! Afinal, se você assistir às três seasons do desenho animado, vai saber de antemão muita coisa que vai rolar posteriormente no live action.

Pra terminar, mais um alerta importante: a Netflix também disponibiliza no catálogo um terceiro produto, o filme Avatar: The Last Airbender, adaptação produzida e dirigida em 2010 pelo diretor M. Night Shyamalan. E este, sim, é um fiasco e tem pouco a ver com a animação. Então, se quiser assistir, o faça por conta e risco.

Agora, quanto ao seriado live action, não é demais reiterar: sem chororô nem clickbait, Avatar da Netflix é muito bom e fim de papo.

NOTA DO CRÍTICO: Excelente!

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