Filme do Chico Bento é bão demais, sô!

Desde as tiras de Hiroshi e Zezinho, onde surgiu em 1963, Chico Bento se mostrou um dos personagens mais engraçados e carismáticos criados pelo genial Maurício de Sousa. Não faltaram aventuras para colocar o caipirinha no panteão dos melhores quadrinhos nacionais, das milhares de tiras em jornal e  HQs nos gibis mensais (e almanaques especiais) ao mangá Chico Bento Moço, passando por Graphic Novels que vão do riso puro – caso de Pavor Espaciar, de Gustavo Duarte – à emoção que traz lágrimas aos olhos em Arvorada, obra de arte assinada por Orlandeli.

Então, quando a Biônica Filmes e a Maurício de Sousa Produções anunciaram que levariam o personagem ao cinema em um live action, a responsabilidade e a expectativa eram enormes. A boa notícia é que Chico Bento e  Goiabeira Maraviósa correspondeu  a ambas: o filme é bão demais, sô.

Para começo de conversa, ou melhor dizendo, pra iniciar a prosa, não tem como não elogiar a escolha do ator mirim Isaac Amendoim. O garoto de 11 anos, que já encantava muita gente com os vídeos que postava no Instagram para os até então 4 milhões de seguidores, não interpreta Chico Bento. Isaac Amendoim é o Chico Bento.

A brejeirice, o jeito de falar um caipirês impecável (ou seria impecáver?), a alegria de viver, a teimosia arraigada e nem sempre inteligente, a simplicidade e todas as demais características do personagem das HQs transbordam no menino. E, por mérito dele, vêm acompanhadas de altas doses de fofura. Aliás, não custa lembrar que Isaac Amendoim já foi confirmado pela TV Globo no elenco da vindoura novela Êta Mundo Melhor, prevista para junho deste ano.

 

A história do filme é típica de qualquer gibi do Chico Bento, na linha natureza x progresso. E se inicia contada pelo próprio Chico, numa quebra de terceira parede muito bem bolada e pra Deadpool nenhum botar defeito. Num dia típico na vida da roça, o garoto está se aprontando para um compromisso. Estas cenas iniciais, com participação da galinha Giserda e companhia, e com uma interpretação literal de um certo jeito de arrumar o cabelo, já dão o tom do longa e arrancam as primeiras gargalhadas do público.

Para explicar aonde vai, Chico conta um causo sobre a goiabeira que fica nas terras do vizinho Nhô Lau e a intenção do Coronel Agripino e o filho Genesinho de derrubarem a árvore para que uma estrada de asfalto passe no local. A partir daí, o filme se desenvolve com as tentativas do garoto, acompanhado pelo inseparável primo Zé Lelé e toda a garotada da roça, de impedir que o progresso chegue à Vila Abobrinha fazendo a goiabeira como vítima.

O final, claro, é previsível, mas o grande mérito do roteiro (assinado por Elena Altheman, Fernando Fraiha e Raul Chequer) é fazer o público desfrutar de cada momento até chegar nele. Quem já leu os gibizinhos de Maurício de Sousa vai reconhecer vários elementos das HQs por ali.

Da doçura poética da história da sementinha da goiabeira, contada originalmente por Vó Dita a Chico, às aulas de dona Marocas e às desventuras de Nhô Lau tentando impedir os meninos de roubarem goiaba. A sensação é de uma imersão pura e intensa no universo do personagem, onde não faltam de imagens bucólicas ao humor simples que faz rir das bobagenzinhas de crianças (e de adultos também).

Por falar em adultos, vale citar que Guga Coelho está muito bem como Nhô Bento e Luís Lobianco encarna Nhô Lau com perfeição. Debora Falabela aparece pouco (mas bem) como dona Marocas e Thaís Araújo acerta o tom como a goiabeira no sonho (?) de Chico.

Destaque ainda para Rafael Saraiva, que tem poucas falas como Leocádio,  pai do Zé Lelé, mas se destaca em cada uma delas. Por falar no primo inseparável do Chico, quem escalou o elenco merece os parabéns por ter encontrado o menino Pedro Dantas. Se Isaac Amendoim é o Chico Bento de verdade, Pedro não fica muito atrás e faz um ótimo Zé Lelé de carne e osso.

 

Vale ainda render elogios aos cenários do filme, que retratam bem uma vilazinha do Interior, mas com grande atenção aos detalhes. E na parte do sonho revelação, os efeitos para gerar o Chico-formiga e o Chico-passarinho (ambos já apareceram em histórias em quadrinhos, diga-se) estão bem-feitinhos e combinando com a aventura infanto-juvenil.

Tem mais? Sim. A cena final com Rosinha (sem dar spoilers) tem um lirismo notável, acentuado pela escolha bem-feita de música de Renato Teixeira, e remete diretamente a histórias como “Minha visão preferida”, escrita e desenhada por Vitor Cafaggi para a obra MSP50, de 2009. Cafaggi, para quem não lembra, é um dos autores de duas Graphic MSP (Laços e Lições) já levadas ao cinema com sucesso.

 

 

Cenas pós-créditos e Tábata

Muita gente fica com duas perguntas na cabeça assim que o filme acaba (o que em muitas salas de cinema está ocorrendo sob aplausos, é bom registrar). A mais imediata é: devo esperar para sair, ou melhor dizendo, esperar por uma cena pós-crédito?

 

A resposta é não, neste filme não há cena posterior, ainda que valha a pena assistir aos créditos para ver os desenhos de cenas do filme que aparecem junto com eles. Mas para quem curte “momentos tradicionais Marvel”, em vez de cenas pós crédito o filme tem uma cena “Stan Lee cameo”, ou seja, o criador Maurício de Sousa mais uma vez aparece em participação especial como um personagem secundário, entusiasmando o público.

A segunda pergunta frequente, em especial pra quem não anda lendo os gibizinhos regulares do Chico é: quem é essa tar de Tabata? A maioria dos leitores reconhece de pronto Chico, Rosinha, Zé Lele, Hiro e Zé da Roça. E alguns mais antigos até mesmo identifiquem Maria Cafufa em uma cena rápida na sala de aula da dona Marocas.

 

Mas o fato é que muitos ainda não foram apresentados à Tabata, que se une ao quinteto principal para salvar a goiabeira. É compreensível, já que a menina tem apenas cinco anos “de vida” nas HQs do caipira. Criada em janeiro de 2020, a garota estreou em Chico Bento Nº 57, na aventura As Goiabas da Coragem.

Tábata é descrita como uma menina tímida, questionadora e esperta. “Gosta muito de brincar com os amigos e aprender coisas novas. É apaixonada por mangás, artes marciais e videogames e adora a experiência de viver no campo, junto à natureza”, diz a descrição oficial da Turma da Mônica Wiki. Ah, sim, ela também é uma praticante da capoeira, apesar de nenhuma destas características mais marcantes ter sido aprofundada no filme.

Resumindo, Chico Bento e Goiabeira Maraviósa é uma ótima pedida para crianças e adultos, um daqueles filmes que faz você sair do cinema mais leve. E, claro, com uma terceira pergunta na cabeça: será que teremos um Chico Bento 2?  A conferir.

 

Em tempo: desde março de 2025 o filme está disponível pra ver no streaming, via Prime Vídeo

 

NOTA DO CRÍTICO: Excelente!

Djota Carvalho

Dario Djota Carvalho é jornalista formado na PUC-Campinas, mestre em Educação pela Unicamp, cartunista e apaixonado por quadrinhos. É autor de livros como A educação está no gibi (Papirus Editora) e apresentador do programa MundoHQTV, na Educa TV Campinas. Também atuou uma década como responsável pelo conteúdo da TV Câmara Campinas e é criador do site www.mundohq.com.br

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