A lista de encrencas em que se meteu Ezra Miller, intérprete do personagem-título de The Flash, é digna da galeria de vilões do personagem da DC Comics. A “capivara” inclui invasão de propriedade e roubo de bebidas, brigas em bares, agressões a mulheres em karaokês (com direito a arremesso de cadeiras), acusação de roubo de passaporte e cartões de créditos de um casal e de manipular uma menor de idade.
Com tudo isso vindo à tona nos últimos anos, muito se temia que o público resolvesse cancelar Ezra – e, consequentemente, o filme The Flash. Não à toa, a estreia foi adiada de novembro de 2022 para junho de 2023, o que também deu tempo do roteirista e atual todo-poderoso- da-DC Studios, James Gunn, mexer no filme em busca de salvação.
E, a julgar pelo trailer divulgado no badalado intervalo do Super Bowl no dia 12 de fevereiro e pela reação do mundo a este aperitivo do filme, a salvação vai acontecer. Pelas mãos de ninguém menos do que Batman. Ou, para ser mais específico, de um Batman: aquele do filme de 1989, interpretado por Michael Keaton.
Afinal, apesar de o trailer ter trazido muita informação e revelado bastante do roteiro (ao menos para quem acompanha quadrinhos e teve confirmada a inspiração na série Flashpoint), o que realmente empolgou foi a presença do Morcegão clássico. Aliás, muito bem construída, com direito a variação da música tema do filme dos anos de 1980 e a famosa frase “I´m Batman”.
Mais ainda, foram mostradas uma cena de luta do Homem-Morcego mandando muito bem e outra dele utilizando uma arma secreta beeeem eficiente: a Supergirl. Não, não se trata da loirinha do seriado da CW, mas de uma Kara Zor-El de cabelos escuros e curtinhos, com visual claramente inspirado em Cir-El, uma versão alternativa da heroína que apareceu nas HQs em 2003.
Vale lembrar que o trailer também mostra outro Batman, o mais recente, interpretado por Ben Affleck nos filmes Liga da Justiça e Superman versus Batman, e que há dois Flashes em cena. Mas, mesmo com tudo isso, o que deixou todo mundo entusiasmado e gerou mais comentários foi mesmo Bat-Keaton.
Mas afinal, por que tem dois Flash no filme? E dois Batman?
Para responder a esta pergunta é preciso primeiro falar sobre a inspiração do filme. Trata-se do arco de histórias batizado de Flashpoint (na versão brasileira, Ponto de Ignição), lançado originalmente em 2011. Na HQ, Barry Allen, alter ego do Flash, acorda em um mundo bem diferente daquele com que estava acostumado.
A mãe dele, que havia sido assassinada quando Barry era pequeno, está viva. Os poderes di herói, porém, desapareceram. O mundo – ou o que resta dele – vive em meio a uma guerra entre Atlântida (capitaneada pelo Aquaman) e as amazonas de Themyscira, chefiadas pela Mulher Maravilha.
Barry procura pela Liga da Justiça e descobre que ela não existe. Há apenas uma exceção: Batman. Allen encontra o Cavaleiro das Trevas e descobre um homem mais velho. Batman, agora, é Thomas Wayne, o pai de Bruce, que neste mundo paralelo morreu com a mãe no famoso assalto do Beco do Crime.
Com auxílio de Wayne, Barry tenta recuperar seus poderes – usando, inclusive, de raios para tentar reviver a origem deles. Nas HQs, o herói chega a se queimar inteiro antes de conseguir voltar a ser o Flash.
Com a ajuda do Cyborgue, que neste mundo paralelo é uma espécie de líder da resistência, os dois acabam encontrando um alienígena desnutrido, mantido em segredo pelo governo. É a versão de Clark Kent desta realidade, que foi preso ainda pequeno pelo governo depois que a nave que o levava caiu em Metrópolis – e não em Smallville – matando mais de 35 mil pessoas.
Resgatado por Batman e Flash, o alienígena é exposto ao sol amarelo, ganha poderes e ajudará, de uma maneira ou de outra, na tentativa de acabar com a guerra. Importante dizer que Barry, confirme vai tomando conhecimento dos fatos, fica convicto de que está numa linha do tempo alterada no passado por um dos mais tradicionais inimigos do velocista, o Flash Reverso, que também aparece na HQ.
Contudo, acaba descobrindo pela boca do próprio inimigo que quem mudou tudo foi ele mesmo, Barry Allen, ao ir para o passado e ter conseguido evitar o assassinato da mãe – gerando o famoso Efeito Borboleta e mudando tudo.
Thomas Wayne – e vários outros heróis e vilões – acabam morrendo em batalha e Barry Allen consegue, a muito custo e com a dor de ter de deixar a mãe morrer novamente, voltar para o tempo dele.
Porém, para fazer isso acaba tendo de unir três diferentes linhas do tempo, o que causa diversas mudanças no mundo, algumas mais perceptíveis e outras não. Na verdade, essa HQ acabou sendo o ponto de partida para um dos reboots de personagens da DC Comics, que foi batizado de “Os novos 52.”
A fusão das linhas do tempo foi usada como justificativa para as alterações que a editora queria fazer, mudando fatos da vida dos heróis – os pais humanos de Superman, Matha e Jonathan, por exemplo, a partir daquele momento haviam morrido antes mesmo de ele mudar para Metrópolis.
Vale lembrar que Flashpoint também virou uma animação, em 2013, com algumas alterações em relação aos gibis. Ponto de Ignição também foi amplamente explorado na série The Flash, da CW, com Barry indo para o passado salvar a mãe (na tentativa de também limpar o nome do pai, que havia sido preso pelo assassinato) e se confrontando com o verdadeiro assassino, justamente o Flash Reverso.
No seriado isso ocorreu mais de uma vez e, a cada ida ao passado, novas mudanças aconteciam no “presente”, bagunçando a vida de Barry e o mundo. E como isso fica no filme?
Por tudo o que se sabe até agora, o filme parte do mesmo princípio. Sem dar atenção para os conselhos do Batman de seu universo original (o interpretado por Ben Affleck), o Flash acaba indo ao passado e salvando a vida da mãe. Porém, diferentemente da HQ, ele não acorda em outra linha temporal e, sim, gera uma nova da qual não faz parte.
De alguma forma ainda não explicada, ele acaba saltando de volta para o “presente” onde descobre a existência de outro Barry Allen – que, convenientemente para o público, tem um corte de cabelo bem diferente e identificável.
Neste mundo, aparentemente não existem mais seres superpoderosos, porém Batman continua na ativa. Assim como na HQ, um Batman mais velho, Michael Keaton, porém ainda não está claro se este Batman será Thomas ou Bruce no filme (os saudosistas dos anos de 1980, claro, preferem que seja Bruce mesmo).
As imagens do trailer também deixam claro que haverá tentativas de recuperar os poderes do Flash envolvendo raios e aparentemente também não darão resultado de primeira. E que em algum momento os dois Flash – haja Ezra Miller! – ganharão poderes.
Também já é sabido que, diferentemente da HQ, não haverá uma guerra “mundial” entre Aquaman e Mulher-Maravilha. A ameaça, agora, será o general Zod (Michael Shannon). Antes que o Flash bagunçasse o tempo, a invasão promovida pelo vilão kryptoniano à Terra havia sido impedida pelo Superman (no filme Homem de Aço, de 2013, com Henry Cavill no papel título).
Porém, como isso não aconteceu nesta linha temporal modificada por Flash, o estrago será grande a não ser que os (poucos) heróis o detenham. E é ai que vem outra mudança significativa de roteiro: assim como na HQ, no filme existe um alienígena mantido prisioneiro secretamente, mas não se trata de Kal-El/Clark Kent e sim de Kara Zor-El, a Supergirl.
Flash reverso na parada?
Uma coisa que não está clara até o momento e que está gerando ansiedade nos fãs é se o filme irá ou não introduzir o Flash Reverso no universo cinematográfico da DC Comics e como isso será feito.
A princípio, é impossível se pensar em Flashpoint sem Flash Reverso. E, sabedor disso, James Gunn e o diretor Andy Muschietti já fizeram questão de deixar os fãs com a pulga atrás da orelha. Na cena em que as duas versões do herói se encontram pela primeira vez, o Flash “cabelinho” está vestindo amarelo e com fones de ouvido amarelos, o que remete ao uniforme do vilão.
Mais ainda, ele dispara um “Você roubou minha cara”, o que remete aos gibis. Isso porque nas HQs o vilão – cujo verdadeiro nome é Eobard Thawne – já assumiu a aparência do Flash/Barry Allen para se passar por ele.
Por fim, o trailer mostra dois rapidamente dois Flashes com uniformes diferentes, um deles escuro – até aqui, chamado de Dark Flash. Será que um dos dois Barry Allen do filme irá se tornar o vilão?
Respostas só a partir de 16 de junho, quando filme estreia nos cinemas para o grande público. Ou um pouco antes, dependendo dos spoilers que vazarem da première exclusiva que será exibida na CinemaCon 2023, marcada para abril.
Vai ter reboot?
A outra questão latente gerada pelo filme The Flash é se, assim como aconteceu com a HQ Flashpoint, ele será um ponto de partida para um novo universo da DC nos cinemas. Tudo indica que sim.
Afinal, James Gunn assumiu o posto prometendo mudanças radicais. Entre elas, já freou um segundo Adão Negro com The Rock e demitiu Henry Cavill, o que é uma possível razão para não haver Superman e, sim, Supergirl no filme estrelado por Ezra Miller.
A “mexida” do Flash na linha do tempo poderá, então, ser uma justificativa para se mudar atores e atrizes e se descartar filmes passados das cronologias “oficiais” da DC no cinema ou, ao menos, ignorar os filmes que já foram lançados no que virá por aí. A conferir.
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