Espremido entre dois lançamentos blockbusters da Marvel – Capitã Marvel e Vingadores Ultimato – o filme Shazam! ganhou bem menos atenção e destaque do que deveria. Estrelado pelo engraçado e simpático Zachary Levi, que encantou quem foi a São Paulo na Comic Com Experience 2018 pelo carinho que teve com os fãs (em especial os menorzinhos), porém, Shazam! é uma aventura que vale a pena ser conferida.
E não só porque – como chamaram a atenção várias resenhas – tem uma boa pegada de comédia, mas também porque qualquer filme que consegue ter 2h12 sem citar uma única vez o nome do super-herói principal merece respeito! Ãh? Como assim? É isso mesmo: em nenhum momento dos 132 minutos da película o nome do herói (que pra quem não se lembra é “Capitão Marvel”), é citado.
Trata-se, é claro de uma sacada proposital e brilhante em torno de um dos fatos curiosos que envolve o personagem criado em 1940. É que de 1954 a 1973, o herói ficou afastado das bancas por causa de uma ação judicial da DC Comics contra a Fawcett Editora, dizendo que o Capitão Marvel era uma cópia do Super-Homem.
Nesse meio tempo, a Marvel Comics registrou o nome “Marvel” e lançou um personagem chamado Capitão Mar-Vel em 1967 (o antecessor da atual Capitã Marvel), de forma que quando o herói de uniforme vermelho voltou à ativa, não podia usar o próprio nome nas capas dos gibis sem incorrer em processo e multas.
Para resolver o problema, o nome do personagem (que viria a ser comprado pela DC) foi trocado nas capas dos gibis pela palavra mágica “Shazam”, que o menino Billy Batson se utiliza para se transformar e destransformar no herói. E que, por sinal, é formada pelas iniciais de deuses e heróis mitológicos que representam os poderes dele (a sabedoria de Salomão, a força de Hércules, a resistência de Atlas, o poder de Zeus, a coragem de Aquiles e a velocidade de Mercúrio).
Dentro das HQs, porém, ele continuava a ser chamado de Capitão Marvel. Por sinal tanto nas dele quanto nas de outros personagens: quem lei a excelente série Kingdom Come, por exemplo, pode conferir uma excelente participação do Capitão na história que reúne praticamente todos os heróis DC em um futuro sombrio).
De volta ao filme, não dava para chamar o personagem por Capitão Marvel nele, ainda mais com a heroína da concorrente ainda nos cinemas – para quem não sabe ou não se lembra, em inglês o nome de ambos é absolutamente igual, Captain Marvel, já que a palavra “captain” é usada para ambos os gêneros. E se o herói fosse batizado como”Shazam”,iria se transformar ou destranformar cada vez que se apresenta-se a alguém…
A solução para resolver isso foi usar a criatividade no próprio argumento do filme: ao receber os poderes (e a forma adulta com que fica ao usá-los), o garoto Billy Batson não sabe direito como funcionam e por isso procura o irmão adotivo Freddy Freeman, um fanático por histórias de super-herói.
Isso rende uma série de hilários testes de poderes elaborados por Freddy, mas também diversas tentativas de encontrar um nome para o alter ego de Billy. Assim, o herói é chamado durante o filme por Freddy de Captain Sparklefingers (Capitão Dedosbrilhantes), Thundercrack (Trovão), Mr. Philadelphia (em referência à cidade onde se passam os fatos), Power Boy (Garoto Poderoso), Red Cyclone (Ciclone Vermelho), Maximum Voltage (Voltagem Máxima), Sir Zaps-A-Lot (um trocadilho com o nome Lancelot e o fato do personagem ter poderes elétricos e utilizá-los com freqüência), Human Powerstorm (Tempestade de Poder Humana) e ZAP-tain America (ok, você entendeu esse e o trocadilho, que é sensacional, perde a graça se precisarmos explicar…).
Já todos os demais personagens do filme apenas se referem ao herói de maneira genérica: “That superhero guy”/ aquele cara super herói. Sem dúvida uma solução brilhante, elecante e divertida para um problema bizarro de direitos autorais.
O filme
O roteiro de Shazam! É, como seria de esperar, a história da origem do personagem. Ela começa, porém, um pouco antes, mostrando como sem querer o mago que busca alguém para proteger o planeta acaba criando o vilão da história, o cruel Thaddeus Sivana (que nas histórias em quadrinhos brasileiras era chamado de doutor Silvana).
Por sinal, muitas resenhas do filme diziam que ele era leve e totalmente comédia ,fugindo totalmente do clima mais sombrio típico dos filmes da DC, mas as cenas iniciais do menino Sivana com a família, bem como a descoberta de Billy do porque a mãe são bastante sombrios se comparados ao resto da história.
De volta a ela, então: um misterioso mago (interpretado por Digimon Hounson) procura uma pessoa nobre e pura que possa receber poderes para defender a humanidade das monstruosidades dos sete pecados capitais. Billy Batson (Asher Angel), um órfão que se perdeu da mãe num parque de diversões e que por anos a procura inutilmente (e que por causa das fugas para fazer isso não consegue parar em nenhuma família adotiva) é o escolhido.
Ele recebe os poderes justamente quando acabara de ser colocado em uma nova família, formada por um casal que adotou e cria diversas crianças de diferentes idades. Normalmente indiferente a quem o adora, Billy acaba se envolvendo com os irmãos, em especial Freddy (Jack Dylan Grazer), um garoto de humor sarcástico que tem problemas físicos e anda com a ajuda de muletas.
Quando recebe os poderes, Billy não sabe o que fazer com eles e recebe a “ajuda” de Freddy, que pensa que ele pode ser um super-herói . Os dois começam a testar os poderes dele, fazer vídeos no Youtube e a se divertir – o que rende boas risadas dos espectadores. Porém as coisas desandam quando o ego de Billy cresce demais e os poderes atraem o cruel Silvana, que dedicou a vida a procurar o mago que, na mente dele, o arruinou (e talvez o vilão não esteja tão errado quanto a isso).
Quem lia as histórias em quadrinhos verá diversas citações a eles. O tigre de pelúcia falante Tawny (ou Tony), por exemplo, não está presente, mas há uma referência clara ao personagem no Parque de Diversões. Já o verme superinteligente Senhor Cérebro (mr. Mind) aparece rapidamente durante a aventura, mas volta com força nas cenas pós-créditos.
Tendo lido ou não as HQs, a diversão é garantida e é um filme família (e sobre família), como fica claro no finalzinho, quando ocorre algo previsível e que todo mundo já esperava – e que nem por isso é menos divertido. E, sim, os fãs de quadrinho já sabiam, afinal já sabem das histórias o que ocorre com Freddy e Mary, ainda que esta última no filme seja bem mais velha que Billy Batson.
Cabe ressaltar ainda dois pontos do filme. Primeiro, a cena final, quando Shazam cumpre a palavra que deu a Billy e aparece na escola acompanhado de um convidado surpresa. A ideia remete a um ótimo crossover dos dois personagens (não, não diremos quem é o convidado: nada de spoilers) e já dá indícios de que o Capitão Marvel (ou Shazam!, como queiram) poderá, sim, ser integrado a histórias ao lado da Liga da Justiça ou outros personagens DC.
A outra cena pós-crédito, na qual Billy e Freddy zombam dos poderes de outro herói DC, também vale a pena de ser assistida. Tudo leva a crer, porém, que ela foi gravada antes do lançamento de Aquaman, afinal os comentários parecem fazer referência mais ao personagem tradicional dos Superamigos do que à versão anabolizada de Jason Momoa. Mesmo assim, risadas garantidas.
Enfim, se você é um dos muitos que não deu tanta atenção à Shazam! , não perca a chance de se redimir, pois Zaptain Amé…., quer dizer, Maximum Voltage, ou melhor: aquele carinha super-herói é diversão garantida.
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