Em 1957 a revista argentina Hora Cero Semanal trouxe aos leitores as primeiras três páginas de uma História em Quadrinhos seriada de ficção científica e clima apocalítico, El Eternauta. Quatro amigos estão jogando cartas enquanto ouvem o rádio noticiar que testes nucleares estariam sendo realizados na América Latina. Pouco tempo depois começa a nevar em Buenos Aires, mas não é uma neve qualquer: ter contato com ela mata, como descobre da pior maneira a maioria da população da capital portenha.
Prometendo ser tão ou mais instigante que a HQ que durante dois anos manteve milhares de pessoas toda semana esperando por uma nova edição da revista chegar às bancas para ler as três páginas seguintes, a série O Eternauta estreia no próximo dia 30 de abril na Netflix.
O diretor e criador Bruno Stagnaro – que escreveu o roteiro junto com Ariel Staltari – garante que a produção mantém o espírito da história em quadrinhos original e a visão do criador da HQ, o escritor Héctor Oesterheld, que faleceu em 1977. A julgar pelas cenas do trailer, ao menos visualmente a série se mostra fiel à arte do desenhista Solano López.
O clima de medo explorado nas HQs – que refletia o medo da guerra nuclear e paranoias em relação a alienígenas comuns nos anos de 1950 – também é bem captado na versão para as telas. Nos dois casos, o fio condutor da história é o personagem Juan Salvo, que na produção argentina levada ao streaming é interpretado pelo ator Ricardo Darín.
Ele é o dono da casa onde os quarteto de amigos está se divertindo no carteado quando a nevasca cai. Após a nada feliz descoberta de que a neve mata, eles são obrigados a ficar na residência e cabe a Salvo assumir o comando do que vai se tornar uma luta por sobrevivência bem maior do que qualquer um pensava.
Na HQ, a esposa e a filha de Salvo, Elena e Martita, estão na casa com ele. Mas o seriado, a julgar pelo trailer, adicionou um elemento ao drama do protagonista, que ficará separado da menina. Independentemente de qual for o caso, Salvo terá que improvisar um traje de proteção, sair de casa – até porque não há comida suficiente – e enfrentar o que a humanidade tem de pior e sempre vem à tona em situações extremas, quando muitos acabam lutando com o semelhante em vez de se unir a ele.
Em meio ao cenário caótico de sobrevivência do mais forte, alguns ainda esperam por ajuda, mas, como diz um deles, e se o que chegar não for ajuda? De fato, a situação que parecia ser “apenas” um inverno nuclear acaba se mostrando como algo bem pior e os seres humanos vão ter de aprender que, como diz a frase escolhida para ser marca da série, ninguém sobrevive sozinho.
A primeira temporada de Eternauta terá seis episódios e, para ser realizada, utilizou 2900 atores (entre elenco e figurantes), mais de 50 locações, 30 cenários virtuais e 500 máscaras para os personagens da série. Segundo a produtora K&S Films, foram gastos dois anos de desenvolvimento e redação de roteiros, quatro meses e meio de pré-produção, 148 dias de filmagem em Buenos Aires e mais de um ano e meio de pós-produção.
HQ teve duas versões
Publicada originalmente de 1957 a 1959, a HQ El Eternauta teve uma segunda versão uma década após o final ter sido publicado, por um desejo do próprio autor, Héctor Oesterheld. Ele mesmo roteirizou El Eternauta 1969,mas trocou o desenhista Solano López por Alberto Breccia.
Além de ter determinado a mudança de traço, Oesterheld fez algumas mudanças e supressões no roteiro original, trocando referências à guerra fria dentro da história por metáforas às ditaduras que estavam ocorrendo na América Latina, em especial na própria Argentina.
Uma curiosidade mantida em ambas as versões é que Oesterheld se coloca como personagem em ambas. A história de El Eternalta se inicia justamente quando um viajante do tempo – o tal Eternauta – se encontra com a versão quadrinizada de Oesterheld e conta a ele a aventura que viveu até ali.
No Brasil, em 2024 a editora Pipoca & Nanquim lançou O Eternauta (Edição Definitiva), com 372 páginas contendo a obra completa publicada nos anos de 1950.
Comentar