Vingadores dão ultimato nas viagens no tempo

De dr. Who ao Franjinha da Turma da Mônica, de Hermione e Harry Potter aos clássicos como Back to The Future e Terminador, máquinas e viagens do tempo abundam em seriados, histórias em quadrinhos, filmes e livros. Em Vingadores Ultimato (Avengers Endgame), porém, viajar no tempo é essencial para que o roteiro do filme funcione e, paradoxalmente, é também diferente do que a maioria dos produtos da cultura pop propõe. Por isso mesmo, muita gente sai do cinema debatendo – e alguns, quebrando a cabeça – sobre o tema.

A chave é prestar atenção nos diálogos de Hulk com o Homem-Formiga e, principalmente, com a Anciã, mas o MundoHQ dá uma geral na(s) teorias pra ajudar quem não entendeu. Ou seria para confundir ainda mais?

Vamos começar do início: presentes na imaginação e na cultura pop, as viagens do tempo são temas de ampla discussão entre os cientistas. Até recentemente a maioria dizia que seria impossível (Stephen Hawking entre eles), ainda que alguns interpretassem a Teoria da Relatividade de Einstein para afirmar que em tese elas poderiam ser possíveis para o futuro, mas não ao passado.  Buracos de Minhoca, Táquions, Mecânica Quântica, Cordas Cósmicas e cilindros gerando em alta velocidade (acima da luz) também se embaralham na defesa dos que acreditam ser possível viajar no tempo.

Em 2014, inclusive, pesquisadores da Universidade de Queensland (Austrália) simularam uma viagem no tempo usando partículas de luz, os fótons, e mostraram que, em tese, dois fótons que viajam no tempo iriam interagir, sugerindo que, pelo menos em um nível quântico, saltar ao longo do tempo pode ser possível. Na prática, claro, nunca ninguém registrou uma viagem destas, mas muito se especula sobre como elas seriam e quais são as conseqüências. Vamos então ao filme:

– O primeiro ponto a se prestar atenção é que Scott Lang, o Homem-Formiga, é quem surge com a possibilidade de viajar no tempo. Na cena final de Homem Formiga e Vespa, Scott fica preso no mundo quântico, um lugar onde as leis do tempo não se aplicam. Enquanto Janet van Dyne (a vespa original) envelheceu exatamente 30 anos nas três décadas em que esteve por lá, Scott descobre – quando reaparece em Ultimato – que enquanto esteve naquele lugar por cinco horas, cinco ANOS se passaram na Terra. Ou seja, o segredo da viagem do tempo está no nível quântico (ponto pros cientistas australianos!)

– Quando Hulk desenvolve então seu protótipo para testar a viagem, Scott cita as teorias de viagem do tempo amplamente consolidadas pelo filme De Volta para o Futuro (Back to the Future) e Hulk explica que não é bem assim que a coisa funciona. E aqui é fundamental abrir um parêntese para explicações.

Back to the future lida com a tese de que o passado pode ser alterado, ou seja, se você muda alguma coisa no passado que tenha certa relevância, tudo a partir dali muda em sequência. A ideia é famosa no mundo científico por meio do chamado “paradoxo do avô”, desenvolvido por Kurt Gödel em 1949. Na prática, se um viajante do tempo pudesse impedir que seus avós se conhecessem, ele acabaria evitando o próprio nascimento. É por isso inclusive que no filme estrelado por Michael J. Fox o personagem Marty MacFly começa a desaparecer quando interfere sem querer no namoro dos pais. E, mais um detalhe, o viajante do tempo não pode encontrar consigo mesmo (ou ao menos se reconhecer) ou as consequências podem ser imprevisíveis.

Essa teoria de passado mutável trabalha normalmente com duas possibilidades. Em uma, que é a de Back to The Future, quando a pessoa muda o passado ela altera automaticamente o presente/futuro para todos, menos para si mesma. O viajante do tempo passa a ser uma anomalia temporal, o único que tem memória de como as coisas eram antes de ser mudadas por ele. Assim, quando Marty MacFly altera o passado fazendo com que o pai venha a se tornar no novo presente um famoso escritor de ficção científica, só ele, Marty, tem as memórias de que o pai era um idiota fracassado. Para o próprio pai, a linha anterior do tempo nunca ocorreu, as coisas sempre foram daquele jeito. Resumindo, você pode viajar no tempo e mudar tudo, desde que não evite seu próprio nascimento de alguma forma.

A outra possibilidade é bem diferente: quando você muda o passado, gera uma linha temporal paralela. Imagine, por exemplo, que você viaja no tempo e cai com a máquina que proporcionou a viagem em cima do seu pai, matando-o. Pela primeira teoria, você o mataria e consequentemente mataria a si mesmo, pois nunca teria nascido (e começaria a desaparecer inexoravelmente enquanto o tempo “se consolida”, como em Back to the future). Porém, se você nunca nasceu, como poderia ter viajado no tempo em primeiro lugar e matado o seu pai? Hã?

Para resolver esse problema (rs), a teoria é a seguinte: se você viajar no tempo e matar seu pai, vai gerar a partir daquele momento uma linha do tempo paralela, na qual seu pai vai ter morrido. A sua linha original, porém, continuará existindo. Portanto, haverá agora dois futuros diferentes, dois mundos paralelos, um em que seu pai continuou vivo e você nasceu, e outro em que ele morreu e você nunca existiu (ou passará a existir a partir daquele momento da infeliz aterrissagem na cabeça dele…). Viagens do tempo, portanto, gerariam diversos universos alternativos. Esta teoria aparece muuuuuito nos quadrinhos.

Fechemos o parêntese e voltemos ao Ultimato. Hulk apresenta uma nova teoria, que é como a coisa vai funcionar no filme. O passado para quem viaja no tempo é imutável, está consolidado. Se não fosse assim qualquer alteração do passado poderia impedir a viagem até ele pra começo de conversa e assim tudo voltaria à estaca zero. Portanto as coisas só podem ser mudadas no presente, ou seja, a partir do ponto em que começa a viagem no tempo. É por isso que o “conserto” da tragédia de Thanos tem de ser feito no presente e não no passado.

Faz sentido. As pessoas ainda não foram desintegradas no passado, como poderiam ser trazidas de volta? E, se por acaso fossem trazidas de volta logo na sequência ou se Thanos fosse morto antes disso então os fatos que levaram até a criação da máquina do tempo sequer teriam ocorrido e, portanto, a viagem não ocorreria e não impediria nada. Confuso? Um pouco, mas voltemos ao exemplo original.

Você viaja no tempo e aterrissa na cabeça do seu pai.  Seu pai morto e você mesmo são anomalias do tempo e não vão afetar em nada o que já foi havia acontecido. O que significa que o Capitão América ter enfrentado a versão passada de si mesmo não causou nada no presente e que Loki ter fugido usando o Tessaract também não afetou o presente (mas, sim, há agora um deus da mentira vivo em algum lugar, um Loki-anomalia-do-tempo e não aquele que morreu no espaço nos eventos de Guerra Infinita).

Isso também explica como o Thanos do passado – junto com a Gamora do passado, a Nebula do passado e companhia – pôde saltar para o presente pegar as joias sem ter mudado tudo o que tinha ocorrido antes: eles são anomalias vindas de um passado que já estava consolidado e, portanto, não podia ser alterado. Porém, todos podem morrer no presente (como de fato ocorre com a galera do mal).

Note que quem pula do passado para o presente mantém as memórias que tinha até então, pois não viveu todo o período que pulou. É por isso que a nova Gamora não se lembra de Quill, uma vez que eles ainda não se conheciam quando ela executou o salto no tempo.

Então, graças a este novo conceito de efeitos da viagem no tempo, dois Thanos morrem no filme  Ultimato, um já aposentado após ter usado as joias do tempo e o segundo vindo do passado para pegar as joias no presente. E o Thanos que veio do passado, ao morrer, não afetou nada do que a sua outra versão havia feito, justamente porque ele era uma anomalia e o passado já estava consolidado.

Mas aí vem a pergunta: neste caso, se o passado está consolidado, porque é necessário voltar no tempo para devolver cada uma das joias no momento em que foeam retiradas? Neste ponto vem a explicação da Anciã (ou “Monja” como muitos estão chamando a tutora do dr. Estranho): as joias são responsáveis pelo traçado do tempo/espaço/realidade. Retirá-las e não devolvê-las poderia causar consequências desastrosas, entre as quais o surgimento de universos paralelos e diferentes linhas do tempo.

Ok, tudo explicado e coerente, resta uma única questão: ao voltar no tempo pra devolver as joias, Steve Rogers optou em reencontrar o amor – a namorada Peggy Carter, que “deixou” quando foi incidentalmente congelado – e envelhecer normalmente. Isso quer dizer que enquanto um capitão estava congelado, o do presente estava por lá, provavelmente à paisana,  casado com sua amada (quando Sam pergunta quem é a esposa de Steve ao ver a aliança, ele se recusa a revelar). Uma sacada excelente do filme, que “conversa” com a série Agent Carter – que pode ser conferida na Netflix.

Isso porque, no seriado, quando a agente se revela casada, nunca diz quem é o marido, que fica escondido a sete chaves. Ou seja, filme e seriado confirmam juntos a tese de que Steve Rogers voltou mesmo à francesa e viveu discretamente o amor que tanto almejava.

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