Em um mundo cada vez mais impactado por casos de depressão, estresse, burnouts e afins, a saúde mental é um assunto cada vez mais presente nas mais variadas mídias (aliás, não custa lembrar, o mais recente blockbuster da Marvel, Thunderbolts*, é um exemplo disso). Não à toa, o tema se faz presente na HQ Gezebel, de Fred Ouro Preto (argumento) e Jack Azulita (desenhos), onde a personagem principal – Géssica – terá de enfrentar os próprios demônios. De maneira tanto abstrata quanto literal.
Frustrada com o trabalho, a protagonista da obra – que a editora paulista Mistifório irá lançar na Perifacon e que já está em pré-venda – tem um colapso nervoso e começa a questionar a realidade profissional que estava vivendo. Em busca de uma alternativa, Géssica retoma um antigo projeto de fazer uma história em quadrinhos que havia idealizado, sobre uma demônia chamada Gezebel.
A criatura é uma funcionária que ocupa um cargo burocrático na Cidade do Fogo, no Inferno. Aos poucos, porém, elementos do gibi que Géssica está criando começam a assombrar a vida da autora.
Sentindo-se ainda mais sufocada que antes, Géssica não sabe se está sendo vítima de uma peça pregada pela própria mente fragilizada ou se, por alguma razão inexplicável, a realidade e a ficção estão se misturando de verdade.
Para saber se o que acontece é delírio da personagem ou algum tipo de magia (das trevas?), porém, é preciso ler as 152 páginas da história que, além do argumento instigante de Ouro Preto, se destaca pela arte diferenciada de Azulita.
Para falar mais sobre Gezebel, o MundoHQ ouviu a dupla em entrevista exclusiva, que você confere abaixo. Lembrando que o gibi será lançado oficialmente na Perifacon, nos dias 26 e 27 e julho na Fábrica de Cultura do Jardim São Luís (São Paulo), e está sendo comercializado por valor promocional de R$ 65,00 na pré-venda.
Ah, antes de conferir o bate-papo vale ainda destacar uma informação importante sobre a história: Gezebel possui um projeto de adaptação para cinema já aprovado e em fase de captação de recursos. O longa-metragem também será dirigido polo próprio Fred Ouro Preto, que já tem na bagagem uma indicação ao Emmy Awars 2021 com o filme Amarelo – é tudo pra ontem (Netflix), com roteiro de Mariana Bastos e produzido pela Capuri Filmes.
Dois dedos de prosa com Fred Ouro Preto
MundoHQ – É só um detalhe, mas chama a atenção: a grafia dos nomes Gezebel e Géssica, normalmente escritos com “J”, aparecem na HQ com “G”. Há uma razão para isso ou é só capricho do autor?
Fred Ouro Preto – Exatamente, a intenção era causar essa estranheza, eu conheço uma pessoa chamada Gezebel com “G” e isso sempre me chamou atenção, então decidi ir assim.
De onde veio a ideia para o roteiro?
A temática principal da HQ é saúde mental, stress e problemas relacionados a ambientes de trabalho. A inspiração veio duas colegas que tiveram episódios de burnout bem severos, então pensei em fazer um terror em torno disso. Mas também sempre gostei de roteiros que têm uma história dentro de outra, como Adaptação e Synedoque NY, do Charlie Kaufman.
Independentemente do que realmente está ocorrendo na HQ, a história tem um quê de metáfora: após um burnout e tendo de começar uma nova carreira, a protagonista tem que enfrentar seus demônios. Isso foi proposital?
Totalmente, na HQ tem muitos diálogos que fortalecem esse conceito. Mas o principal é que a maior questão é da personagem com ela mesma, independente do ambiente de trabalho.
Não sei se é cedo para isso, mas se você pudesse escolher uma atriz brasileira ou internacional para interpretar Gezebel e Géssica, quem seriam?
Meu sonho seria Alice Carvalho, até fiz a personagem um pouco inspirada nela fisicamente. Também gostaria que no elenco tivesse participações de artistas do mundo da música como, por exemplo, Emicida ou Duquesa.
A HQ é um oneshot ou pode haver mais histórias com esse mesmo universo?
Pode haver, sim, já existem outras sinopses que se passam no mesmo universo, porém com personagens diferentes.
Como foi o seu relacionamento com o desenhista? Você deu liberdade para ele criar o visual dos personagens, determinou como eles seriam ou foi uma criação conjunta? Aliás, o que te motivou a escolher Jack Azulita para desenhar a história?
Foi excelente, quando cheguei em uma versão avançada do roteiro eu busquei diversos artistas pelo Behance e marquei entrevistas, gostei do Jack não só pelo estilo, mas também pela impressão que ele passou de que seria um processo organizado e – também muito importante – por termos referencias e gostos parecidos. Os concepts dos personagens e cenários fizemos através de troca de referências. Inicialmente, alguns personagens logo de primeira já chegamos no resultado, alguns passaram por três ou quatro rodadas até ficarem como estão na HQ.E o desenho em si, íamos fazendo por sequências, ele desenhava rascunho de cerca de oito a dez páginas, eu fazia observações, ele ajustava e indo avançando. Após termos a HQ completa fizemos novas rodadas de ajustes, já olhando a obra como um todo.
Bate-papo com Jack Azulita
MundoHQ – Como você entrou no projeto? No seu Instagram há diversas histórias (muito boas, por sinal) com vampiros, monstros, lobisomem, fantasmas e criaturas da noite. Foi o tema que te atraiu para Gezebel?
Jack Azulita – Na verdade a abordagem veio do Fred, ele me encontrou pelo twitter, acho, foi um dos primeiros lugares que alguns quadrinhos meus começaram a viralizar, na época ainda em preto e branco, aí fomos conversando sobre o projeto e desenvolvendo as páginas.
Quais foram suas inspirações para criar os cenários e personagens da história?
Fred tinha algumas referências de como ele imaginava os personagens, principalmente. Os cenários urbanos acho que não tem nada muito específico, mas para o inferno eu me baseei muito no manga Dorohedoro, tem uma vibe muito parecida com cidades sujas e cheias de caveiras, acho que funcionou bem aqui.
E como artista de quadrinhos, quem são suas referências/ídolos?
Eu gosto de muitas coisas diversas, não necessariamente só de quadrinhos de terror, eu sou muito fã do trabalho do Brian K Vaughan, Saga e Papergirls estão sempre nas minhas referências, também gosto muito de Deadly Class, foi onde eu encontrei um estilo de cores principalmente que eu queria seguir em quadrinhos. E, claro, Hellboy, hahaha, acho que é o mais óbvio.
Nas HQs do seu Insta, você faz roteiro e arte, certo? Como isso é diferente de Gezebel, por exemplo, onde o roteiro já veio fechado? Muda alguma coisa?
Sim, são processos diferentes de produção. Com Gezebel o Fred tinha um argumento de história que seria inicialmente para um filme, depois ele me entregou um roteiro nesses moldes e eu trabalhei junto com ele na decupagem disso para um quadrinho. Então por mais que eu não tenha escrito propriamente o processo de organizar quadros e ângulos, que é algo que eu faço nos meus roteiros, também esteve presente
Para mim, de alguma forma, o seu trabalho exibido no insta dialoga com o do Ted Naifeh em Courtney Crumrin. Você conhece /gosta?
Eu conheço de vista, já esbarrei em alguma HQ em algum momento, mas não é uma referência direta.
Quando você começou a desenhar profissionalmente? E, se puder revelar, qual é o próximo quadrinho nos seus planos, seja como desenhista ou roteirista e desenhista?
Acho que profissionalmente em 2020. Me formei em design gráfico em 2018 e trabalhei pouco tempo na área, logo comecei a trabalhar com ilustração editorial e, enfim, quadrinhos. Esse ano tenho outro quadrinho a ser publicado pela Devir Editora, Petricor, que é uma história que já vinha trabalhando a alguns anos, e pretendo fazer uma edição impressa para o fim do ano com algumas histórias que publico nas redes sociais.
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