O Senhor do Oriente Médio

Mundo HQ

Lanterna Verde: o Senhor do Oriente Médio

Não é de hoje que os quadrinhos refletem, em diversos níveis, a ideologia e os momentos pelos quais passam os países onde eles são produzidos. Mas fazia algum tempo – provavelmente desde a época do Vietnã, quando o Super-Homem foi ao front resgatar soldados norte-americanos – desde a última vez em que uma história de super-herói tentava abertamente justificar as posições americanas. Pois bem, em uma aventura que acaba de chegar às bancas brasileiras, o Lanterna Verde resolveu dar uma forcinha para as posições recentes de George W. Bush em relação ao conflito no Oriente Médio, na edição especial O Senhor do Anel (46 páginas coloridas, papel couchet, nas bancas por R$3,50).
A história, cujo título brasileiro é apenas uma tentativa de aproveitar o sucesso do filme de Peter Jackson baseado na obra de Tolkien (se você espera encontrar hobbits ou magos contracenando com o Lanterna, esqueça), começa de maneira bem ingênua e até engraçada. Kyle Rainer, o Lanterna, é convidado (como última alternativa) para representar seu antecessor em uma cerimônia diplomática de um planeta distante, Tendax.
Rayner parte pelo espaço com a namorada e chega ao tal planeta, que tem uma beleza deslumbrante e até mesmo uma praia aprazível onde sua namorada, Jennifer/Jade (nada a ver com Giovanna Antonelli na novela das oito), resolve fazer topless contrariando a vontade do herói.
A história, no entanto, aos poucos se revela: Tendax é uma planeta que foi dominado por muito tempo pela guerra por território entre duas facções, Matiac e Magdum. Os dois lados se degladiaram durante décadas por meio de guerras e atos de terrorismo. Um líder, no entanto, conseguiu estabelecer um curto período de paz (cinco anos), com uma certa ajuda do primeiro Lanterna Verde, Bill Clinton, oops, Hal Jordan.
O tal líder há muito tempo havia, ele mesmo, lutado usando a força, mas acabou se tornando um pacifista e pacífico primeiro ministro que conseguiu a paz temporária. Não, o nome dele não é Ytzhak Rabin, é Illus.
Mas acontece que em meio às comemorações de paz, uma facção reinicia o reinado de terror – com direito a explosões a bomba que matam inclusive crianças inocentes.
Lanterna Verde e Jade decidem ficar e ajudar a manter a paz, só que os terroristas descobrem uma poderosa arma secreta que, em uma alusão a armas químicas, possibilita grande poder ao mesmo tempo em que degera os corpos de quem as usa.
Se até este ponto ainda restava alguma dúvida em relação à história ser uma metáfora ao oriente médio, aqui aparece um reforço bem claro: a "língua secreta" usada pela facção para acionar a arma é escrita com semelhança extrema à escrita árabe.
Mas a coisa não pára por aí. Quando está morrendo, o líder "inimigo" afirma "Fiz isso pelo meu povo. Eles assasinaram nossas crianças, incontáveis vítimas, meus filhos, minha esposa…" e o Lanterna retruca ao moribundo: "Mas onde isso vai parar? Quantas outras crianças têm que morrer? Tem um número certo? Quando vocês vão chegar em um acordo?"
Obviamente, o enredo ainda não está completo, afinal o primeiro ministro Rabin morreu assassinado, não? Pois o primeiro ministro Illus também.
O Lanterna Verde então decide que o melhor é ir para casa e não se meter mais na guerra, pois, afinal, fazer o quê, pergunta, impor a lei marcial?
E conclui: "Os negociadores da paz morreram. É uma Guerra Santa. O povo tá disposto (sic) a se sacrificar… e morrer… por uma causa. Quem a gente vai proteger? De que lado ficamos? Eu e você não somos parte disso… e nem podemos ser". E assim, a história termina com os Estados Unidos, ou melhor, com o Lanterna Verde indo pra casa e resolvendo não mais se meter no conflito.
Não sem antes de ainda prever o pior para o tal planeta Tendax. Jade pergunta: "A gente vai voltar ?". E o Lanterna responde: Jen, não vai sobrar nada pra gente voltar…"
A HQ termina por aí e talvez tenha convencido boa parte dos leitores dos EUA de que o país não devia se meter mesmo no conflito entre israelenses e palestinos. Só que, no último dia 4 de abril, George W. Bush resolveu mudar sua postura em relação à Guerra Santa e os Estados Unidos prometem voltar a se envolver no conflito. Pelo visto, Lanterna Verde e Jade voltarão a Tendax antes do que imaginam.

Djota Carvalho

Dario Djota Carvalho é jornalista formado na PUC-Campinas, mestre em Educação pela Unicamp, cartunista e apaixonado por quadrinhos. É autor de livros como A educação está no gibi (Papirus Editora) e apresentador do programa MundoHQTV, na Educa TV Campinas. Também atuou uma década como responsável pelo conteúdo da TV Câmara Campinas e é criador do site www.mundohq.com.br

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