Por Ricardo Quintana*
Em 2007, tentando organizar o encontro de Ilustradores de Campinas, conheci através do IlustraGrupo (lista de discussão dos Ilustradores) a Aline Boetcher e o Mario Cau
.
Eu já havia trocado alguns e-mails com o Mario (no IlustraGrupo) e não tinha ido muito com a cara dele… Respondi alguma coisa que ele perguntou e o bonitão não me respondeu nem agradecendo nem criticando e eu fiquei muito indignado (é, Marião, você vai ouvir isso o resto da vida). Ao nos reunirmos para o encontro de ilustradores – que naquela ocasião ganhou o nome de Sandubão Ilustrado –, nos encontramos no Franz Café, e pude conhecê-lo um pouco melhor.
O Sandubão aconteceu com umas 20 pessoas, entre elas, estava meu grande amigo e também professor da Pandora Bira Dantas, que sugeriu chamar o Mario para dar aula na Pandora, mas, naquela época, estávamos com nosso quadro completo e a coisa acabou não acontecendo.
Poucos meses depois, um dos nossos professores precisou sair e surgiu a necessidade de procurar alguém. Como já tinha a indicação do Mario e eu sabia que ele dava aula no Estúdio Paulo Branco (que agora também é professor da Pandora), liguei e ele entrou para a nossa equipe em setembro de 2007.
Nesses quase três anos, vimos uma grande evolução no trabalho do Mario. Ele finalmente começou a publicar sua “Pieces”, com histórias e arte dele mesmo, desenhou vários projetos menores e revistas independentes, publicou algumas coisas no mercado americano e ainda fez free-lances para várias agências e editoras.
E agora, em março de 2010, mais precisamente no dia do aniversário do Bira, o Marião, com um sorriso de orelha a orelha me deu a notícia:
— RICHARD!! VOCÊ ESTAVA ACOMPANHANDO O TWITTER HOJE??? – E, sem me dar tempo para respoder, concluiu – CARA, VOU DESENHAR UMA HISTÓRIA NO MSP + 50 DO MAURÍCIO DE SOUZA!!!
Pra entender como o Mario estava nesse dia, é mais ou menos como se você tentasse colocar toda a roupa que você está vestindo dentro da sua carteira… é, ele não cabia em si, de verdade.
Depois da notícia, todos nós temos acompanhado o dia-a-dia do Mario e a cada dia mais alegrias. Os esboços prontos, as páginas finalizadas, as primeiras cores feitas pelo
Caio Yo, a visita do Mario ao Estúdio do Mauricio e, acredito que o ciclo de felicidade quase insuportável do Mario só irá terminar quando ele pegar o exemplar impresso da revista. Bom, particularmente, acho que ele nunca vai deixar de pensar nessa história com grande alegria e felicidade, afinal a realização de um sonho de infância é algo que vai te acompanhar para o resto da vida.
Mas, melhor do que eu ficar falando sobre a história, é ouvir do próprio Mario como tudo aconteceu. Com isso, por dois motivos, fiz uma pequena entrevista com ele. Primeiro, para registrar esse momento para a posteridade e, segundo, porque poucas pessoas tem a felicidade de ser chefe dos seus ídolos. E eu sou uma dessas pessoas, e não poderia deixar passar.
Ricardo: — Como e quando você recebeu a notícia da sua participação no MSP + 50?
Mario: — Foi no começo de fevereiro. Recebi uma ligação do Sidney Gusman, editor da MSP 50. Foi um diálogo bem divertido, que eu trasncrevi depois no Blog e na entrevista pra Banca de Quadrinhos:
M: — Alô?
SG: — Alô! Mario Cau?
M: — Isso, sou eu. Quem é?
SG: — Sidney Gusman, meu velho! Como está?
M: — Grande Sidão! Tudo bem por aqui! E você?
SG: — Tudo bem, Mário. Seguinte, tenho uma pergunta pra vc.
M: — Manda!
SG: — Você sabe guardar segredo?
M: — Ãhn… Acho que sim, sei sim…
SG: — Então, bem-vindo ao time do MSP + 50!!!
M: — AAAAAAAAAAEEEEEEEEEHHHHHHHH!!!! 8- D
Na hora, eu nem sei dizer o que senti. Era felicidade descomunal e, até agora quando penso nisso, fico sorrindo por algum tempo que nem bobo.
Houve um fato legal ano passado, que meio que me preparou para isso. Estávamos na FIQ, em Belo Horizonte. Numa tarde, eu, Sidão, Pablo Mayer, Diogo César e mais umas pessoas estávamos conversando sobre como o MSP 50 tinha sido maravilhoso. E o Sidão disse que nós 3 tínhamos sido considerados para o primeiro livro, mas como era muita gente, não rolou. Fiquei honrado de ter sido, pelo menos, considerado por ele. E claro, o Brasil tá cheio de gente muito boa, claro que eu ficaria de fora. Mas aí ele disse que se, por acaso, rolasse um segundo livro, nós também seríamos considerados. No final, tanto eu quanto o Pablo fomos convidados para o segundo!
Ricardo: — Por que você não contou pros amigos sobre a sua participação?
Mario: — Eu não podia! A pedido do Sidney eu ia guardar segredo até que ele revelasse os nomes, o que levaria um tempo ainda. E valeu a pena esperar. O Sidney fez toda uma mobilização no Twitter, revelando 5 nomes por dia. O meu foi da primeira ou segunda leva, então eu aguentei menos do que o resto da equipe. E no momento que ele e eu divulgamos, eu já estava com o roteiro aprovado, e a HQ inteira desenhada. Estava, se bem lembro, fazendo a arte-final. E ninguém sabia.
Um dia, numa aula da Pandora, meu aluno Vencys_lao perguntou se eu tinha sido chamado pro MSP + 50, e eu, que já tinha sido, disse que ainda não. O Sidão já tinha divulgado que o time estava completo, e nessa conversa acho que deu a entender que eu não tinha sido chamado. Mas, por dentro eu queria contar.
Outro fato engraçado foi que um dia os alunos estavam folheando meu sketchbook, e o mesmo Vencys_lao viu a página onde eu tinha desenhado/escrito o roteiro da MSP + 50. Ele perguntou: “— É a Turma da Mônica?”, e eu tremi na base, e respondi: “— É”. E ficou por isso mesmo. Ele nem percebeu que era desse projeto!
Ricardo: — Foi difícil segurar a língua e não dizer nada?
Mario: — Foi, era desesperador! Eu chegava para dar aulas e ficava louco pra anunciar o fato. Mas não podia. Eu quase contei pra muita gente, inclusive quando inaugurei meu apartamento novo. Lá pelas tantas, sobraram umas 5, 6 pessoas. Se não fosse pela minha amiga Fran, eu, já meio alto, teria contado pra todo mundo! Ela sabia que eu tinha uma coisa pra contar e não podia, então me impediu. As únicas pessoas que sabiam disso desde o início foram meus pais e meu irmão. Logo que fui convidado, desliguei o telefone e liguei na hora pra eles… Não tinha como não contar pra eles.
Ricardo: — Sobre qual personagem é a sua história?
Mario: — Bom, era para ser uma surpresa, no início. Mas depois que o Sidão falou num programa sobre eu usar o Louco, aí eu desencanei. A princípio iria divulgar como uma HQ do Cebolinha e da Mônica. Mas é, temos o Louco, um dos meus personagens favoritos da Turma. A Mônica aparece só no final, mas eu não vou estragar contando o final, né?
Ricardo: — E como surgiu a idéia?
Mario: — Sabe quando você TEM que ter uma ótima idéia, e fica lá jogando idéias num papel, pensando e remoendo, e nada de bom sai? Eu comecei a pensar na história logo depois que fui convidado.
Eu sabia mais ou menos o que queria com a HQ, então fiquei transitando em como contar aquilo. Ia fazer uma HQ com o Cebola e a Mônica já adultos, voltando pra casa e conversando sobre a infância. Pensei em usar o Xaveco, personagem secundário que todos zoam, e colocar o ponto de vista dele. E queria usar o Louco, mas não sabia como encaixar a loucura dele nas minhas histórias.
E aí, um belo dia, as idéias começaram a se encaixar, e eu fui anotando e desenhando loucamente no meu caderno. Terminado, digitei, mandei pro Sidão e alguns minutos depois ele me ligou parabenizando pelo roteiro. Fiquei absurdamente honrado.
Ricardo: — Por que você chamou o Caio Yo para colorir sua história?
Mario: — Bom, sempre disse que eu não sou um pintor, no máximo um colorista. Existe uma boa diferença aí. E o Sidão me pediu uma HQ colorida, apesar de saber que, geralmente, eu faço em PB. Não posso revelar demais, mas as cores tiveram um papel importante na elaboração do roteiro. Eu tinha muito bem definido o que queria quanto às cores nessa HQ. E sabia que muito provavelmente eu não conseguiria fazer como queria.
Quando vi que o prazo estava terminando, convidei o Caio. Sempre gostei muito do trabalho de cores que ele faz, e era exatamente o que eu precisava praquela HQ, indo até além do que eu esperava. O Caio fez um trabalho maravilhoso, e além de colorir a HQ comigo, também fez o letreiramento.
Ricardo: — E pra fechar, como foi conhecer o Mauricio?
Mario: — Foi fantástico. Difícil descrever em palavras. Foi um sonho de criança realizado! Desde pequeno, a Turma da Mônica sempre esteve presente na minha vida. Aprendi a ler, a desenhar e a ser cidadão com as historinhas. E sempre quis conhecer o Maurício, e o estúdio, e ver de perto a produção disso. Desde o momento que firmei a vontade de ser quadrinista, então, o desejo só aumentou.
Nessa visita que fiz com o Danilo Beyruth à MSP, conhecemos não só o tour básico do estúdio (com todos aqueles artistas fantásticos criando as HQs… Você tem que ver, é muito legal; dá vontade de pegar uma mesa e começar a desenhar junto com eles), mas também o estúdio de dublagem dos desenhos animados, o arquivo do Maurício, que tem quase TUDO que ele já desenhou. Pegamos nas mãos a primeira tira do Penadinho, toda amarelada; e uma tira de Os Souzas, que quase ninguém conhece. Nessa tira, pude ver a técnica do Maurício, de pincel, pena, e cara, ele É mestre. Dá gosto de ver aquela qualidade de traço diretamente dos anos 70.
Ficamos com o Maurício na sala dele, mostrando desenhos, trocando gibis, autógrafos, comentários. Falamos de materiais, de mercado, de sonhos. O cara é uma máquina de idéias, e acredite, a gente ainda vai ouvir muita coisa legal vinda dele. Também tive a chance de conhecer o Mauro Souza e o Zé Márcio Nicolosi, que eu admiro demais. Saí de lá me sentindo uma criança cheia de sonhos. E quer coisa melhor para um artista que isso?
***
Logo depois de feita a entrevista com o Mario, essa semana, saiu a noticia de que a Revista Pieces, escrita e desenhada por ele está concorrendo ao HQMIX desse ano. Definitivamente, 2010 é o ano do Mario no Horoscopo do Quadrinho brasileiro. Parabéns Marião, estamos torcendo por você.
*Matéria originalmente publicada em http://blog.pandora.art.br
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