Freak World, a volta do Údi Grúdi

Mundo HQ

O údi grúdi voltou

Misture um franzineiro carioca de nome sueco e um skinhead que – além de não ser racista – atende pela simpática alcunha de Zé Colméia. O resultado é a revista Freak World ("mundo anormal"), uma saudável volta dos quadrinhos underground às bancas brasileiras. A revista criada e editada por Johandson Rezende e pelo já citado "amigo do Catatau" chegou este mês às bancas das principais cidades brasileiras – entre as quais São Paulo, Taubaté, Campinas e Rio de Janeiro -, mas já ganhou resenhas e elogios até na França e no Canadá. Freak World é claramente inspirada pelo movimento underground norte-americano, que surgiu nos anos 60 e 70 quando autores como Gilbert Shelton e Robert Crumb lutavam contra a censura imposta às HQs dos Estados Unidos e o mercado das grandes editoras, publicando suas histórias – recheadas de sexo, drogas e rock n’roll – em revistas bancadas por eles mesmos, no circuito alternativo ou underground ("subterrâneo").
O movimento trouxe à cena autores considerados mestres nos dias de hoje, além de ter inspirado outros quadrinhos do gênero aqui mesmo no Brasil (Angeli, por exemplo, é fã declarado de Crumb e começou sua carreira como um cartunista underground) e até mesmo na sisuda Inglaterra, onde nos anos 90 surgiu o gato Firkim (de Hunt Emerson e Tym Manley), um crítico dos hábitos sexuais dos ingleses… e do restante da humanidade. Em Freak World, é este mundo "udí grúdi" que volta às bancas brasileiras, tanto no formato e no papel barato que este tipo de revista costuma a ser publicado quanto, principalmente, no traço descompromissado e nos temas sem censura – ainda permeados pela trinca sexo, drogas & rock – e sem obrigação de agradar a ninguém, salvo os próprios autores.
Johandson – que no Brasil virou "Jô Andisson" mesmo – tem 23 anos e ajuda o pai no comércio, mas tem como principal profissão os quadrinhos. Fã das revistas da Mônica quando era pequeno, decidiu logo cedo que ia ser quadrinista. "Resolvi fazer HQs e comecei com o Freak World sendo um fanzine, destes xerocados e distribuídos por mim mesmo. Me baseei um pouco no (grupo de rock) Dead Kennedies, que para conseguir entrar no mercado fazia, vendia e distribuia os próprios discos. Quadrinhos e rock são coisas paralelas", diz. A aventura começou com zines feitos para uma banda underground, a Zumbi do Mato. Logo depois veio, ainda em formato fanzine, o Freak World número zero. A revista vendeu 800 cópias pelo correio, um verdadeiro marco. Johandson, então, se uniu a Zé Colméia – "que desenha, vende, distribuí, faz marketing e muito mais"- e juntos procuraram a editora independente Taquara, que resolveu apostar no projeto. "O resultado foram os primeiros cinco mil números, que chegaram às bancas agora em maio."
Além dos quadrinhos de Johandson e Zé Colméia, a revista também traz histórias de outros autores, todos zineiros. Alguns personagens, no entanto, deverão ser fixos. "A coelhinha Adriana (inspirada pela namorada do autor), Tosco Boy e o cupido Skinhead que persegue o amor já conquistaram muitos fãs aqui no Rio por meio do Fanzine, então eles provavelmente aparecerão com regularidade nas revistas", diz Johandson, explicando que os números 2, 3 e 4 já estão prontos e que o próximo exemplar chega às bancas no dia 15 de junho. O primeiro ainda pode ser adquirido nas bancas por R$ 1,99. Johandson – que é fã de outro personagem underground, o pouco conhecido no Brasil Cerebus, um porco criado por Dave Sim – acrescenta que não está ganhando dinheiro com a revista e esta não é sequer a prioridade dele e de Zé Colméia no momento. "O que queremos é colocar a revista na banca. Estamos bancando do bolso porque sabemos que tem quadrinho bom no Brasil e ninguém faz nada para publicá-los. Bem, a gente faz. O papel é ruim, a capa é em duas cores para não encarecer o preço, mas o gibi está lá. É melhor que ficar reclamando e coçando o saco como fazem alguns quadrinistas. O lucro vem depois", acredita.
Ele acrescenta que as histórias de Freak World (o fanzine) começaram com a intenção de atingir leitores de todas as idades, depois passaram para a trilogia "sd&rr" e agora seguem uma linha de maior crítica social (mais ainda com bastante ênfase no humor e, pelo menos, no rock n’roll). As HQs que estão sendo publicadas na revista, que também traz artigos diversos relacionados ao mundo HQ/Rock, são as melhores das safras do zine.
Quanto ao fato da publicação ter ganho resenhas favoráveis da crítica especializada de outros países – como a revista canadense Fan Burn e a francesa "Boca do Mundo", Johanson se diz até um pouco surpreso, já que não tem idéia de como as publicações ficaram sabendo que a Freak World existia. Com certeza, por mais incrível que pareça, deve ter sido no boca-a-boca. Afinal, esta sempre foi a maior arma dos quadrinhos underground na luta para conquistar um espaço mantido com unhas e dentes pelas HQs das grandes editoras. Que venha o segundo round.

Contatos com Johanson e Zé Colméia podem ser feitos pelos e-mails johandson@lycos.com e smart_alex@bol.com.br, respectivamente

Djota Carvalho

Dario Djota Carvalho é jornalista formado na PUC-Campinas, mestre em Educação pela Unicamp, cartunista e apaixonado por quadrinhos. É autor de livros como A educação está no gibi (Papirus Editora) e apresentador do programa MundoHQTV, na Educa TV Campinas. Também atuou uma década como responsável pelo conteúdo da TV Câmara Campinas e é criador do site www.mundohq.com.br

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