CCXP dez…cepcionou?

Em uma palavra: sim. Pronto, falei.

Antes de mais nada, porém, é bom deixar claro: a Comic Con Experience – mais conhecida como CCXP – continua sendo o maior festival de cultura pop do Brasil (e do mundo, segundo muitos), tem atrações memoráveis e é agenda obrigatória pra quem gosta de super-heróis, quadrinhos, fantasia, séries, cosplays, ver popstars mais de perto e afins.

Nada disso, porém, esconde o fato de que a décima edição do evento ficou aquém do esperado. Até mesmo por comparação: a CCXP 2022 foi (muito) melhor que a desse ano.

Se você não esteve lá, presencialmente, talvez não tenha essa impressão, uma vez que ver e ler boas matérias derivadas do evento no celular ou no micro dificilmente trará essa compreensão. Em parte, porque a imprensa se foca nas celebridades presentes, às quais tem acesso muito melhor do que quem vai ao evento, ainda mais neste ano de 2023.

Aparentemente, para a mídia, o único problema foi uma pulseirinha da amizade que alguém jogou no palco e teve o azar de acertar o olho da atriz Florence Pugh…

Mas boa parte das mais de 287 mil pessoas que estiveram lá nos quatro dias de evento saiu, sim, com sentimento de decepção. Por quê? A gente explica.

Ausência de nomes de peso?

Por ser um marco (o aniversário de uma década de evento), a expectativa era enorme por grandes nomes do cinema e streaming em geral. E não sem embasamento, já que em anos anteriores não faltaram -em quantidade e qualidade – estrelas de Hollywood, anunciadas ou aparecendo de surpresa.

Sempre é bom lembrar, por exemplo, que em 2018 os principais astros do elenco de Homem-Aranha longe de casa (Tom Holland, Jacob Batalon e Jake Gyllenhaal) apareceram sem aviso prévio.  No ano passado, para ficar mais perto,  Bruna Marquezine e Xolo Maridueña, de Besouro Azul. E neste ano? Acertou quem disse “ninguém.”  

A bem da verdade, a decepção da galera já começou quando, com ingressos esgotados para sábado (tradicionalmente o “dia de peso” do evento), foram anunciados Chris “Thor” Hemsworth, quatro atores do elenco de Duna 2 (Timothée Chalamet, Zendaya, Austin Butler, Florence Pugh) e Jason Momoa, de Aquaman. Porém, na sequência, foi confirmado que Chris iria na quinta e os demais no domingo, o que gerou diversos protestos nas redes sociais, com a galera reclamando que “só porque o sábado já está vendido” estavam pulverizando as atrações pros demais dias para tentar comercializar mais ingressos.

Se isso é verdade ou não, pouco importa. O fato é que a “pulverização” deixou os dias menos estrelados. Em especial a tradição do sábado ser forte em grandes nomes não correspondeu.

Já antecipando possíveis contestações: Jodie Foster esteve lá, mas com todo respeito à grande estrela, metade do público de cultura pop atualmente não sabe direito quem ela é (e, convenhamos, ela não pode ser considerada no momento um hit da cultura nerd/geek).

O simpaticíssimo Mark Willians agradou, mas, mais uma vez, ainda que amemos Arthur Weasley, dificilmente ele é a estrela da franquia Harry Potter.

É claro que, incontestavelmente, Anthony Daniels – que interpretou C3PO em toda a franquia Starwars – seria a grande estrela do sábado. E foi, mas para pouquíssimas pessoas. A primeira aparição dele foi marcada para as 9h20 no palco Thunder, sendo que a CCXP abria ao público às 11 horas. Ou seja, só para convidados e privilegiados. Havia outro evento com ele no mesmo local às 11h20, quando as filas de entrada ainda estavam lentamente sendo liberadas e, vale lembrar, quem entra na audiência do Palco Thunder não costuma sair: senta, fica pra ver tudo e não abre espaço pra quem está fora.  

Portanto, aquela cena maravilhosa de Daniels entrando no trono carregado por Ewoks, que viralizou na Internet, no evento foi vista por pouquíssima gente. E, infelizmente, o ator foi levado ao Palco Omelete, que é aberto a todos, só no domingo (apesar da agenda do evento divulgar que isso ocorreria no sábado)…

O que salvou o sábado da galera foi a presença do elenco dO Auto da Compadecida 2, mas em termos de peso foi isso e, comparado a anos anteriores, muito pouco.

Só para se ter uma ideia, no ano passado, além dos convidados surpresa já citados, o sábado teve – entre outros – a atriz principal de Wandinha (Jenna Ortega) e a coadjuvante Gwendoline Christie (a também Lady Brienne de Tarth, de Game of Thrones), e ninguém menos que Keanu Reeves no palco aberto, o já citado Omelete.

Ou seja, enquanto em 2022 Keanu segurou a moçada vibrando até às 23 horas, na edição de dez anos o último entrevistado do Omelete foi o (divertido e pouco conhecido) Eli Roth, diretor de Feriado Sangrento, que falou para um público muito minguado por volta das 20 horas. Antes mesmo do horário marcado para o dia terminar, às 21, os corredores da Expo SP já estavam esvaziados…

Agendamentos

O maior problema da edição 2023, contudo, foram os infames agendamentos. Até o ano passado, quem quisesse participar das ativações dos estúdios tinha que enfrentar longas filas, mas, ao final delas, era só correr pro abraço. Neste ano, algum gênio teve a ideia de trocar as filas por agendamento, algo que sequer foi divulgado amplamente: teve quem só descobriu isso quando chegou no local.

Se os agendamentos funcionassem direito, talvez fosse uma boa, mas só uns poucos sortudos conseguiam agendar. A maioria absoluta ficou frustrada. No sábado, por exemplo, houve depoimentos de gente que estava tentando agendar desde o primeiro minuto do dia, desde às seis da manhã, desde às oito… sem sucesso.

No estande da Warner, uma solícita atendente disse que ainda havia vagas, mas o site do estúdio dava as vagas como esgotadas. “Tenta ficar atualizando que vai aparecer vaga”, dizia a moça. Mas nem todas as atualizações do mundo abriram lugar pra ver a ativação do Aquaman e as demais da Warner, da Netflix e de todas as outras empresas.

Só a Amazon Prime não colocou agendamento, ainda que tivesse entrada preferencial para assinantes. Resultado? Filas ainda mais enormes que o habitual, mesmo tendo atividade simultânea para 40 pessoas (o julgamento do Capitão Pátria, de The Boys). 

Ah, e tem mais a cerejinha do bolo: quem conseguiu agendar ou aguentar a fila gigante da Prime, ainda se queixou que havia muitos convidados do evento e dos estúdios com prioridade, cortando o já conturbado esquema.

Ok, alguém pode dizer que os estúdios é que definem como entrar nos estandes, mas eles estão dentro do evento, o que fazem refletem – como refletiram – claramente na imagem da CCXP. Portanto, espera-se que isso seja revisto na edição 2024.

Quando não havia o agendamento, as filas eram grandes, mas bastava entrar nelas e ter paciência para participar das ativações. Com o agendamento bugado que foi feito neste ano, a maioria absoluta das pessoas sequer teve chance de participar. Lamentável.  

Tem mais

A CCXP também pecou nos detalhes. Quem foi ao evento em anos anteriores já se acostumou com a boa organização, que inclui ônibus para traslado gratuito da estação Jabaquara (linha azul) para a Expo São Paulo. Neste ano, porém, sem maiores explicações, o traslado foi deixado de lado, ou melhor, substituído: funcionou a partir de outra linha do metrô, a verde, na estação Santos-Imigrantes.

A informação consta da página oficial da CCXP, mas muita gente não viu e ficou perdido nos arredores da estação Jabaquara, esperando ou tentando em vão pegar um Uber. A solução foi ir a pé até a Expo, embaixo de um sol de mais de 30 graus.

A praça de alimentação também teve problemas. No estande da rede de hamburgueres Johnny Rockets, o painel que informava os números dos clientes quebrou. Totalmente perdidos diante da demanda enorme, os funcionários chamavam aos berros os clientes, em ordem totalmente aleatória.

Um garoto que tinha o rosto protegido por máscara esperou o pedido por 45 minutos até que uma funcionária finalmente chegou à conclusão que alguém havia pego o lanche dele por engano e mandou fazer outro. E a qualidade do hamburguer estava sofrível, com carne fria e sem gosto.

Também houve muita reclamação dos valores praticados por algumas lojas representadas no evento, que estavam vendendo produtos por preços maiores do que podia se encontrar via Internet, já contado o valor da entrega na casa do cliente.

Teve coisa boa?

Sim, teve, claro. Como já foi dito no início desse texto, a CCXP é um megaevento pop, com atrações memoráveis e muita coisa boa. Inclusive, uma tacada certa foi mudar de lugar o Artists Alley, que neste ano estava mais uma vez repleto de feras do traço.

Os estandes dos quadrinistas ficaram bem na entrada, o que fazia o público de cara já ver grandes estrelas (e  buscar autógrafos e comprar edições de quadrinhos e artes), e dispersava melhor a galera entre as atrações.

Mas o critério para a crítica feita neste texto é claro: a comparação com edições anteriores, em especial a do ano passado, e a expectativa de algo ainda mais épico para comemorar uma década de vida. Neste sentido, a resposta é inequívoca. A CCXP 2023 decepcionou? Com certeza.

A expectativa agora é para que a organização do evento – que sempre se mostrou competente para ouvir o público presente e costuma avaliar o evento sem a “babaovice” de muitas mídias – faça uma boa autocrítica e melhore as coisas para a edição 2024.

Até porque nos últimos dez anos a CCXP nadou de braçada no campo das comic cons, oferecendo um produto único. Ainda que ocorram feiras menores, como os circuito Animefest, nada se compara em tamanho e impacto a ela.

O monopólio, porém, pode estar com os dias contados. A Disney – que além da própria marca detém os selos Marvel, Starwars e Pixar – deixou vazar nesta semana que vai trazer a própria Comic Con para terras brasileiras. A D23 Brasil deve ocorrer também em São Paulo, na Transamérica Expo Center, de 8 a 10 de novembro de 2024.

A feira é realizada nos EUA desde 2009 em formato bienal e traz as principais novidades para os parques temáticos, cinemas e streaming, com painéis com conteúdo inédito e convidados atores, diretores e produtores. Também há estandes com experiências, vendas de produtos exclusivos e muito mais. 

Nas terras de Tio Sam, desde que criou a própria comic con a Disney foi abandonando a famosa feira de San Diego e focando na atração própria. Ou seja, na prática a D23 Brasil ameaça esvaziar as atrações da CCXP, que acontecerá pouco depois, de 5 a 8 de dezembro de 2024.

O que vai ocorrer de fato só o tempo vai dizer, e não se deve desprezar de maneira alguma a experiência e o legado da CCXP até aqui para continuar sendo o maior evento da área. Porém, diante do ocorrido neste ano e da possibilidade de concorrência, é bom que a organização fique esperta.

Afinal, o público já se acostumou que a cada ano a CCXP fica mais e mais épica. Quando isso não ocorre, a decepção é grande.  

NOTA DO CRÍTICO: Vale a pena

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