Novos visuais, origens recontadas e até uma transa entre Batman e Mulher Gato: reboot total na DC
Em um episódio de The Big Bang Theory, o físico Sheldon tem uma longa discussão com Stuart, o dono da loja de quadrinhos, sobre quem deveria substituir Batman caso a morte dele se confirmasse (por um tempo). Ao longo do debate, Stuart diz que Sheldon não está levando em consideração os fatos mostrados na Crise que mudaram a cronologia do Universo DC, gerando uma resposta indignada de Sheldon, dizendo que ele realmente não leva em conta a crise. Faz bem ele? Afinal, cada vez que as vendas caem surge uma crise ou um evento que “redefine” o universo DC e, adivinhem? O mais recente deles – dizer último seria ingenuidade demais – chega às bancas brasileiras em junho: os novos 52.
A Panini, editora responsável pela DC no Brasil, inclusive já colocou no ar um belíssimo hotsite – http://www.osnovos52panini.com.br/ – no qual está disponibilizando informações sobre a distribuição dos títulos nos mixes mensais e sobre novos títulos, assinaturas, edições especiais, parcerias, capas e eventos com autores , além de novas informações sobre a série toda semana. E afinal o que são os tais novos 52?
Trata-se de mais uma macrossérie que começa em junho e vai redefinir (ou reiniciar) as histórias de diversos heróis. Ícones como Batman, Superman, Mulher-Maravilha e Lanterna Verde terão novas origens e, nos Estados Unidos, a DC Comics zerou a numeração de todos os seus títulos para marcar a renovação do universo de seus heróis. Aliás, garantem, as novas origens são “mais dinâmicas, eletrizantes e repaginadas para os tempos atuais.” Um reboot total.
Mas antes de falar dos novos 52 em si, é bom relembrar um pouco de história. Reformulações de personagens não são novidade há tempos, afinal o gênero surgiu para o mercado em 1938 e já na década de 1950 “mudou” alguns personagens e reformulações para adequá-los aos gostos do público.
Foi em 1985 (no Brasil, em 1987), porém, que aconteceu a primeira mudança simultânea e ampla envolvendo todos os personagens da editora, com a macrossérie “Crise nas Infinitas Terras”. Capitaneada por Marv Wolfman (argumentos) e George Pérez (desenhos), na época foi a maior saga de super-heróis existente.
Na prática, a editora já tinha lançado até então tantas versões de seus próprios heróis que era preciso unificar, criar uma versão oficial que parasse de confundir a cabeça dos leitores. Afinal, o Super-Homem tinha poderes desde bebê ou os desenvolveu na adolescência? Seus pais adotivos estavam mortos ou vivos? Era possível achar versões diferentes não só do Homem de Aço como de praticamente todos os heróis existentes e a justificativa que a editora encontrou para isso era a existência de “terras paralelas”.
Pois na crise, em virtude de todo um roteiro bem costurado por meio de um super-vilão e de um evento em proporções universais, todas as terras acabam sendo unificadas, com alguns personagens novos surgindo, outros deixando de existir e praticamente todos ganhando uma única versão, origem e história – as poucas exceções acabam “exiladas” da Terra. A partir dali, surgia uma nova “cronologia oficial” (o termo, inclusive) que seria aceita como real e ponto final.
Também a partir dali a DC passou a investir nas novas origens e surgiram a minissérie Homem de Aço – onde John Byrne brilhantemente reforçou a mitologia em torno do Superman descartando de vez elementos dos anos 50 – e o até hoje estupendo e insubstituível Batman Ano Um, de Frank Miller.
Mas com o passar dos anos – e décadas – surgiram mais inúmeras HQs, algumas excepcionalmente boas, outras terrivelmente ruins e milhares medianas. Todos os personagens foram ganhando cores novas, mais versões e novamente os roteiristas teriam de fazer ajustes – inclusive porque queriam trazer de volta versões que davam mais certo antes da crise. E, se em 1985 queria-se deixar o leitor menos confuso, a experiência também mostrou que macrosséries que redefinem tudo também catapultam vendas. Logo…
Em 1994 chegou Zero Hora, mais uma vez para arrumar – ou bagunçar? – a casa. Na série, um Hal Jordan enlouquecido pela destruição de sua cidade enlouquece de decide brincar de Deus, o que não dá muito certo. Entre outras coisas, a série marca a morte de Jordan e do Arqueiro Verde, ambos substituídos por versões mais jovens e arrojadas. Guy Gardner também deixou de ser Lanterna Verde e virou o Warrior, as várias versões de Gavião Negro viraram uma só, o confronto de Batman com o assassino do pai deixou de existir oficialmente, assim como os tempos de garota de programa barata da Mulher Gato.
Em 2005 veio a Crise Infinita. Aliás, a rigor, primeiro veio a macrossérie Contagem Regressiva para Crise Infinita, que contou com eventos que foram de uma guerra cósmica à Mulher Maravilha assassinando Maxwell Lord, tudo isso culminando em uma crise de grandes proporções entre heróis e vilões.
Fazendo um link com a primeira Crise, a de 1985, os argumentistas trouxeram para a história os personagens “exilados” – Superman e Louis Lane da Terra 2, Alexander Luthor da Terra 3 e Superboy da Terra Primordial – que não se conformam com a violência “e corrupção de valores” que tomou conta do mundo heroico.
Com o término da série – que incluiu o Coringa matando Alexander Luthor e um Superboy Primordial totalmente psicopata sendo exilado em uma capsula em torno de um sol vermelho, todos os títulos do Universo DC deram um salto de um ano em sua cronologia e surgiu (ufa, estamos quase lá) a série “52”.
Em 52 semanas – no Brasil a publicação se iniciou em 2007 – o leitor descobriu o que aconteceu após a tal crise. Um ano depois, o trio mais importante da DC está sumido (Batman, Mulher Maravilha e Superman) e a maior parte das HQs é estrelada por heróis até então de segundo escalão, como Adão Negro, Gladiador Dourado, a detetive Montoya e o Gladiador Dourado.
Na série, entre outras coisas, Lex Luthor cria um programa para que todo cidadão possa ter superpoderes (menos ele, que pode “desligar” os poderes quando bem entender ), o personagem Questão morre de câncer e Montoya vira a Questão (uma das primeiras heroínas lésbicas assumidas da DC, bem como uma de suas namoradas, Kathy Kane “Batwoman”).
Por sinal, Batwoman é uma das novas personagens que surge em 52, enquanto diversos secundários morrem. Após várias HQs que incluíram idas e vindas no tempo, o tal Multiverso volta a surgir “em segredo” (ou seja, cronologias diversas podem ser aceitas caso algum argumentista tenha necessidade).
Em 2011 (no Brasil, neste ano) veio a série Flashpoint (Ponto de Ignição), com o Flash original Barry Allen acordando em um mundo estranho, no qual os heróis não são os mesmos – o que ele acredita ser fruto do trabalho do vilão Zoom. Nesta terra, a nave que trouxe o Superman caiu em Metróplolis e matou milhares de pessoas, razão pela qual o Homem de Aço é mantido preso pelo governo; o Batman não é Bruce Wayne e sim o pai do herói, Thomas; o Capitão Marvel não é um, mas sim seis crianças que se transformam em heróis (cada um deles com um dos poderes das entidades que formam o Shazam).
Ao final, Barry descobre o que causou o problema – ele mesmo! – e tenta combinar três linhas temporais em uma única, ou seja, tudo pronto para recriar as histórias dos heróis DC. Então, após esse gigante – e acredite, resumido – interlúdio, o leitor agora sabe porque o lançamento que está chegando são “os novos” 52. Desta vez, em 52 edições, praticamente todos os heróis da DC terão sua origens alteradas, para bem ou para mal.
Aliás, uma curiosidade sobre esta macrossérie: pela primeira vez, serão fundidos dentro das linhas DC personagens do selo Vertigo e dos universos Wildstorm e Milestone. John Constantine, por exemplo, será visto nos gibis DC normais. Mas não vamos colocar o andor antes do santo. A partir de agora, vamos falar um pouco sobre novidades que vão surgir na Macrossérie. Portanto, leitor, se você quer descobrir o que vai acontecer nos gibis e não ler sobre elas antes, é melhor parar por aqui.
Não parou? Então vamos contar algumas mudanças que vem por aí:
– Todos os heróis surgiram no mundo há apenas cinco anos e são motivo de desconfiança. Batman é perseguido pela polícia de Gotham, assim como Superman pelo major Sam Lane (pai de Lois) e pelo “doutor” Lex Luthor;
– Superman, por sinal, tem dois novos looks: um deles com calça jeans e camiseta com S, além da capa, e o outro com uma espécie de armadura modernosa que lembra o uniforme tradicional. E o herói é bem menos escoteiro do que o normal;
– Superman também não pode voar (ainda?) e pode se ferir. Por enquanto, ele também não trabalha com Lois Lane;
– Ajax o Marciano vai integrar o Stormwatch, grupo originalmente da linha Wildstorm;
– Barbara Gordon não é mais paraplégica (os eventos de A Piada Mortal ocorreram, mas ela se recuperou por uma razão que será conhecida no futuro) nem Oráculo. Ela é mais uma vez a Batgirl;
– Arqueiro Verde é mais novo e cheio de tecnologias;
– Vai existir uma Liga da Justiça Sombria, com John Constantine (canalha como sempre) e Zatanna, bela como nunca;
– Static, do universo Milestone, ganha destaque;
– Homem Animal e Monstro do Pântano também;
– Flash é mais rápido do que o Superman;
– Cyborg se tornou no que após ações de Darkseid ;
– Brian Azarello tirou (de novo) as calças da Mulher Maravilha. No sentido literal.
– Parte da sociedade americana acusa a revista da Mulher Gato de ter ficado muito, digamos, sexual (há, inclusive, uma transa entre ela e Batman!)
– Frankenstein é… bem, leia e descubra!
Com tantas mudanças, restam duas perguntas.
A primeira: os heróis ficaram melhores? A julgar pelas vendas nos EUA, sim. Só o primeiro exemplar dos novos 52, para se ter uma ideia, teve 200 mil títulos comercializados em pré-venda e o sucesso continuou com a maioria absoluta dos demais títulos. Vendas à parte, a crítica foi boa à maioria das mudanças e muitas ideias bacanas deram vidas mais interessantes aos heróis que já conhecemos. É claro que há quem preferia ter ficado com seu herói tradicional, mas com certeza vale a pena dar uma olhada no que aconteceu com cada um para formar suas próprias opiniões.
A segunda: estas mudanças vieram para ficar? É fato que a resposta depende da aceitação do público, mas, conhecendo a DC, é possível garantir: com certeza, vieram para ficar: até a próxima crise, claro.
PS: Nem todos os títulos serão lançados no Brasil pela Panini. Em uma parceria inédita, alguns títulos serão distribuídos a Comic Shops e livrarias pela Devir e pela Comix.
(publicado em 27 de maio de 2012)
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