Políticos corruptos, indolentes, cooptados pelo sistema ou covardes demais para lutar contra ele se perpetuam no poder e o povo sofre as consequências. Tudo isso no Japão, claro, ou você pensava que fosse aqui? Mas no excelente mangá Sanctuary dois amigos resolvem que é hora de dar um basta em tudo isso e, não, eles não saem nas ruas em protestos, e sim colocam em ação um plano ousado para minar tudo o que está errado no Executivo e no Legislativo do país do Sol Nascente.
Akira Hojo e Chiaki Asami, os personagens principais da história que no Brasil foi lançada pela Conrad em 2006 e 2008, infelizmente sem chegar ao fim, decidem agir em duas frentes – conforme se aprofunda na história o leitor descobre, inclusive, que a divisão das tarefas foi um tanto quanto aleatória, em uma partida de Jô Ken Pô (Pedra, Papel, Tesoura). Assim, enquanto um deles – Hojo – se embrenha pela trilha do crime, o outro – Asami – entra na política. E, é claro, ambas as frentes se misturam e se sobrepõe constantemente, com direito a intrigas, sexo e uma alta dose de ação e violência.
Usando doses variadas de determinação, criatividade e uma boa dose de loucura, Hojo inicia a carreira de contraventor e vai galgando posições até se tornar um jovem e temível chefe da Yakuza – que, por sinal, ludibria com a mesma facilidade inimigos e a polícia japonesa, em especial a voluptuosa e virginal delegada Kioko Ishihara, que se apaixona fulminantemente por ele.
Asami, por outro lado, é mostrado inicialmente como assistente de um político tradicional, de quem puxa o tapete com inteligência e, também com grande astúcia, vai conquistando cada vez mais poder com o objetivo de se tornar primeiro ministro do Japão. O argumento da HQ é de Sho Fumimura (responsável por Hokuto no Ken) e a arte, facilmente reconhecível em especial pelas mulheres desnudas que permeiam a história (mas sempre sem com “brancos” quando os genitais são focados) é de Ryoichi Ikegami, o mesmo artista de Crying Freeman.
Tanto na política quanto na Yakuza, o Asami e Hojo acreditam que o fim justifica os meios, por isso não hesitam em usar chantagem, força e sexo – nem mesmo uma política durona americana escapa da sedução de Asami, que avisa que, na próxima vez que se encontrarem, serão ambos supremos dirigentes de seus países. Antes de levar a estadunidense para a cama, porém, o japonês dá a ela uma aula sobre livre mercado x cultura e educação oriental.
Conforme a história se desenrola, o leitor fica sabendo que os personagens são amigos de infância e lutam para que o país se torne o “sanctuary” de ambos. Uma luta cujas razões só ficam claras quando é revelado que a dupla é originalmente cambojana: trata-se de sobreviventes dos campos de extermínio do governo dos Khmers Vermelhos (durante o regime de extrema esquerda da vida real, cerca de dois milhões de pessoas foram mortas, sendo que o Camboja tinha, então, apenas sete milhões de habitantes).
Assim, Asami e Hojo lutarão com todas as forças pra que a nova pátria não tome os mesmos rumos de seu antigo país e, mais ainda, se torne realmente um santuário para ambos e para toda a população nipônica. Originalmente, o mangá saiu no Japão de 1990 a 1995, seriada no Big Comics Superior, sendo depois lançada em uma compilação própria com 12 volumes. Nos EUA, a história interia saiu em nove edições e, por aqui, a Conrad lançou apenas até o sexto volume, com um intervalo de um ano após os cinco primeiros saírem.
Como a conclusão da HQ não chegou por aqui, cabe dizer que o plano de Hojo e Asumi dá certo no final, não sem um custo significativo. Sob a mão forte de Hojo, o crime organizado se expande e passa por uma grande reforma. Asami, por sua vez, torna-se o mais jovem indicado a primeiro ministro e a HQ termina com um retorno de ambos ao Camboja. No entanto, nem tudo é feliz no final, já que a uma doença inesperada não respeita os planos para o santuário e caba separando a dupla.
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