História da HQ: quem veio primeiro?

Muito se discute sobre quando surgiu a primeira história em quadrinhos. O marco oficial é dos americanos, com o Yellow Kid de Richard Outcault, em 1895 (saiba tudo sobre este personagem no Quadrindex), mas as HQs já existiam antes do garoto amarelo mostrar seu sorriso dentuço nas bancas de Nova York.

No Brasil, há uma série de especialistas que defendem que o “primeiro” personagem é Nhô Quim, publicado pelo italiano naturalizado brasileiro Ângelo Agostini. Nascido em Piemonte em 1843 e tendo passado a infância em Paris, Agostini chegou a São Paulo em 1859 com a mãe, uma cantora lírica em turnê pelo país. Começou a trabalhar como cartunista na revista Diabo Coxo em 1864, tornou-se colaborador da revista O Cabrião dois anos depois e, em 1967, publicou suas primeira história ilustrada, As Cobranças.

No mesmo ano mudou para o Rio de Janeiro, então capital do Império, e no ano seguinte começa a ilustrar para as revistas O Mosquito e Vida Fluminense. Nesta última surgiria o personagem defendido pelos brasileiros como a primeiro HQ, Nhô Quim, na história As Aventuras de Nhô Quim ou Impressões de uma Viagem à Corte. A história, contada em nove páginas duplas e com todas as características de quadrinho, foi publicada em 30 de janeiro de 1969, ou seja 26 anos antes do Menino Amarelo.


Agostini ainda trabalharia em várias outras revistas – e se veria envolvido em um escândalo que o obrigou a mudar-se para Paris, por ter engravidado uma aluna mesmo sendo casado – antes de ter seu último trabalho publicado no ano de sua morte, em 1906. Este último trabalho, na revista O Malho, em 15 de dezembro de 1906, foi uma história de outro de seus personagens, Zé Caipora.

Em reconhecimento a seu pioneirismo, Agostini foi homenageado pela Associação Nacional dos Cartunistas, que deu seu nome ao prêmio entregue anualmente pela entidade aos melhores trabalhos de cada ano. Pioneiro, de fato, mas teria sido mesmo o primeiro?

ENQUANTO ISSO, NO JAPÃO…

Fato é que antes das histórias de Agostini já haviam outras ilustradas, divididas em quadrinhos e com personagem fixo e separação de texto e imagem, como M.Vieux-Bois , do suíço Rudolph Topffer, publicadas em 1827. Talvez possa se argumentar que as histórias de Topffer não tivessem balões, mas nesse caso é bom lembrar que já havia uma história com falas saindo das bocas dos personagens (ainda que sem o traçado em volta)  um século antes do professor suíço entrar em ação.

Trata-se dos Tobae Sankokushi, histórias sequenciais cômicas desenhadas no Japão. A mais antiga delas data de 1702. Também na mesma época eram populares entre os japoneses os  Ukiyo-zoshi ou “romances do mundo flutuante” (mundo flutuante era o nome dado no Japão aos bairros boêmios). A imagem logo abaixo  é de um deles, que data de 1715: “Caracterização de Jovens Mundanos.”

E, é claro, qualquer um pode argumentar que desenhos pré-históricos nas paredes de cavernas também são um tipo de histórias em quadrinhos, já que contam histórias por meio de arte  sequencial (claro, sem balões já que a escrita sequer havia sido inventada).

Resumindo, é bom reverenciar os grandes artistas de outrora, reconhecer pioneirismos e conhecer o trabalho de cada um deles, mas brigar para saber quem foi o primeiro é besteira. O ideal é que brigar por quadrinhos melhores e mais acessíveis, de todas as nacionalidades, e torcer para que as HQs brasileiras, mesmo que não tenham sido as primeiras, jamais se tornem as últimas.

Djota Carvalho

Dario Djota Carvalho é jornalista formado na PUC-Campinas, mestre em Educação pela Unicamp, cartunista e apaixonado por quadrinhos. É autor de livros como A educação está no gibi (Papirus Editora) e apresentador do programa MundoHQTV, na Educa TV Campinas. Também atuou uma década como responsável pelo conteúdo da TV Câmara Campinas e é criador do site www.mundohq.com.br

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